Crises hídricas globais podem criar 'refugiados da água', diz ativista
por Pedro Alexandre Sanches
Autor de "Faça-se a Água", norte-americano Seth M. Siegel expõe crise global e relata bom exemplo de Israel no tema
Vagner Campos/ A2 FOTOGRAFIA/Fotos Públicas
"População de São Paulo teve sorte", diz Siegel. Na foto, responsável pelo abastecimento da capital, sistema Cantareira chegou a níveis críticos em 2014
A Bacia Amazônica e o Aquífero Guarani aguardam a chegada do advogado, escritor e ativista norte-americano Seth M. Siegel, que estará no Brasil no dia 16 para lançar, nos preparativos para a 1ª Festa Literária da PUC-SP, o livro Faça-Se a Água - A solução de Israel para um mundo com sede de água. O evento acontece entre 23 e 25 de outubro em São Paulo, no campus da universidade em Perdizes.
Em entrevista, Seth Siegel comenta contrastes entre a governança bem-sucedida de Israel para a água e as crises hídricas daqui. "A população de São Paulo tem sorte de certa forma. Recebeu uma segunda chance. Estes dias de melhor abastecimento de água quase certamente não durarão muito", analisa. Confira a entrevista:
CartaCapital: Seu livro "Faça-se a Água" trata da proximidade de uma crise global da água. Como descreveria o estágio atual dessa crise?
Seth Siegel: O governo dos Estados Unidos acredita que, até o ano 2025, 60% da massa terrestre mundial será afetada pela escassez de água. As mudanças climáticas, o crescimento da população, o aumento dos padrões de vida e a deficiência de infra-estrutura da água serão os principais impulsionadores desse problema. Isso levará a instabilidade em muitos lugares. Muitos países já estão sendo vítimas de escassez de água. O problema piora a cada ano.
CC: Que caminho acredita que o mundo está tomando no que diz respeito a isso? Há mais razão para esperança ou para pessimismo?
SS: Não há uma única resposta correta. Problemas de água são um indicativo de má governança. Nos países com boa governança, os problemas da água estão em grande parte controlados. Onde o governo não consegue olhar para a frente, haverá um problema, que pode crescer em uma crise.
CC: Por que seu livro elege Israel como exemplo de combate à crise da água? Como uma região tão conflagrada conseguiu obter sucesso num aspecto tão essencial da vida humana?
SS: Selecionei Israel porque tem o gerenciamento de água, a governança e a tecnologia mais sofisticados do mundo. Embora Israel esteja na região mais seca e tenha uma das populações de mais rápido crescimento do mundo, é notavelmente abundante em água. Gostaria de pensar que todos têm algo a aprender com o exemplo de Israel, e é por isso que decidi me concentrar no exemplo de Israel. Quanto à região, é verdade que o Oriente Médio está em chamas e no caos. Mas Israel foi devidamente chamado de vila em uma selva. O país goza de paz e prosperidade. É ainda mais notável que seja capaz de conseguir isso no meio de guerra, terror e anarquia.
CC: Qual sua expectativa em relação à vinda ao Brasil? Como vê o país, que vive um momento político dramático e altamente conflagrado, no enfrentamento às crises ambientais e à escassez de água?
SS: Uma das melhores maneiras de um governo construir confiança é que desempenhe a governança básica, com segurança nas ruas, água saudável e disponível, escolas e assim por diante. Espero que eu tenha a oportunidade de discutir a política da água com funcionários do governo, professores, estudantes, mídia e líderes empresariais. Mas também espero que minha filosofia de governança também possa ajudar na recuperação de confiança das pessoas no processo democrático e em líderes eleitos em processos justos.
CC: Temos aqui reservas do porte da Bacia Amazônica e do Aquífero Guarani. Que papel acredita que essas riquezas brasileiras poderiam vir a desempenhar nesse enfrentamento? Elas simbolizam também temas de soberania para nosso país, como seria possível equacionar politicamente eventuais conflitos de interesses globais e regionais?
SS: Uma das tragédias de fontes de água em massa, como a Amazônia, é que a água às vezes está disponível onde não é mais necessária, e onde é necessário a escassez é sentida. O Canadá tem uma enorme quantidade de água doce, mas é principalmente no Círculo Ártico e na Baía de Hudson. Poucas pessoas vivem nesses lugares. Não é prático construir um encanamento da Amazônia para São Paulo e outros grandes centros populacionais. É por isso que outras formas de tecnologia e governança são tão importantes. Os lugares secos precisam usar outras técnicas.
CC: O estado de São Paulo, no qual está a maior cidade da América do Sul, enfrentou recentemente uma grave crise hídrica. Pesquisadores alertam que as mudanças apontam para mais escassez nos próximos anos. Como vê essa situação? No futuro próximo do mundo poderemos vivenciar uma situação mais dramática, de êxodo em massa de grandes cidades?
SS: A população de São Paulo tem sorte de certa forma. Recebeu uma segunda chance. Estes dias de melhor abastecimento de água quase certamente não durarão muito. Este período deve ser usado para se preparar para a próxima seca, para que, quando houver, haja menos prejuízo para a economia e a vida das pessoas. Ninguém quer ver refugiados de água, pessoas que fogem de onde moram simplesmente por causa da falta de água para viver suas vidas.
****
Fraude e manipulação da opinião pública:
O cartel dos negócios da água em campanha autárquica
A Bacia Amazônica e o Aquífero Guarani aguardam a chegada do advogado, escritor e ativista norte-americano Seth M. Siegel, que estará no Brasil no dia 16 para lançar, nos preparativos para a 1ª Festa Literária da PUC-SP, o livro Faça-Se a Água - A solução de Israel para um mundo com sede de água. O evento acontece entre 23 e 25 de outubro em São Paulo, no campus da universidade em Perdizes.
Em entrevista, Seth Siegel comenta contrastes entre a governança bem-sucedida de Israel para a água e as crises hídricas daqui. "A população de São Paulo tem sorte de certa forma. Recebeu uma segunda chance. Estes dias de melhor abastecimento de água quase certamente não durarão muito", analisa. Confira a entrevista:
CartaCapital: Seu livro "Faça-se a Água" trata da proximidade de uma crise global da água. Como descreveria o estágio atual dessa crise?
Seth Siegel: O governo dos Estados Unidos acredita que, até o ano 2025, 60% da massa terrestre mundial será afetada pela escassez de água. As mudanças climáticas, o crescimento da população, o aumento dos padrões de vida e a deficiência de infra-estrutura da água serão os principais impulsionadores desse problema. Isso levará a instabilidade em muitos lugares. Muitos países já estão sendo vítimas de escassez de água. O problema piora a cada ano.
CC: Que caminho acredita que o mundo está tomando no que diz respeito a isso? Há mais razão para esperança ou para pessimismo?
SS: Não há uma única resposta correta. Problemas de água são um indicativo de má governança. Nos países com boa governança, os problemas da água estão em grande parte controlados. Onde o governo não consegue olhar para a frente, haverá um problema, que pode crescer em uma crise.
CC: Por que seu livro elege Israel como exemplo de combate à crise da água? Como uma região tão conflagrada conseguiu obter sucesso num aspecto tão essencial da vida humana?
SS: Selecionei Israel porque tem o gerenciamento de água, a governança e a tecnologia mais sofisticados do mundo. Embora Israel esteja na região mais seca e tenha uma das populações de mais rápido crescimento do mundo, é notavelmente abundante em água. Gostaria de pensar que todos têm algo a aprender com o exemplo de Israel, e é por isso que decidi me concentrar no exemplo de Israel. Quanto à região, é verdade que o Oriente Médio está em chamas e no caos. Mas Israel foi devidamente chamado de vila em uma selva. O país goza de paz e prosperidade. É ainda mais notável que seja capaz de conseguir isso no meio de guerra, terror e anarquia.
CC: Qual sua expectativa em relação à vinda ao Brasil? Como vê o país, que vive um momento político dramático e altamente conflagrado, no enfrentamento às crises ambientais e à escassez de água?
SS: Uma das melhores maneiras de um governo construir confiança é que desempenhe a governança básica, com segurança nas ruas, água saudável e disponível, escolas e assim por diante. Espero que eu tenha a oportunidade de discutir a política da água com funcionários do governo, professores, estudantes, mídia e líderes empresariais. Mas também espero que minha filosofia de governança também possa ajudar na recuperação de confiança das pessoas no processo democrático e em líderes eleitos em processos justos.
CC: Temos aqui reservas do porte da Bacia Amazônica e do Aquífero Guarani. Que papel acredita que essas riquezas brasileiras poderiam vir a desempenhar nesse enfrentamento? Elas simbolizam também temas de soberania para nosso país, como seria possível equacionar politicamente eventuais conflitos de interesses globais e regionais?
SS: Uma das tragédias de fontes de água em massa, como a Amazônia, é que a água às vezes está disponível onde não é mais necessária, e onde é necessário a escassez é sentida. O Canadá tem uma enorme quantidade de água doce, mas é principalmente no Círculo Ártico e na Baía de Hudson. Poucas pessoas vivem nesses lugares. Não é prático construir um encanamento da Amazônia para São Paulo e outros grandes centros populacionais. É por isso que outras formas de tecnologia e governança são tão importantes. Os lugares secos precisam usar outras técnicas.
CC: O estado de São Paulo, no qual está a maior cidade da América do Sul, enfrentou recentemente uma grave crise hídrica. Pesquisadores alertam que as mudanças apontam para mais escassez nos próximos anos. Como vê essa situação? No futuro próximo do mundo poderemos vivenciar uma situação mais dramática, de êxodo em massa de grandes cidades?
SS: A população de São Paulo tem sorte de certa forma. Recebeu uma segunda chance. Estes dias de melhor abastecimento de água quase certamente não durarão muito. Este período deve ser usado para se preparar para a próxima seca, para que, quando houver, haja menos prejuízo para a economia e a vida das pessoas. Ninguém quer ver refugiados de água, pessoas que fogem de onde moram simplesmente por causa da falta de água para viver suas vidas.
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Fraude e manipulação da opinião pública:
1. Sumário
2. Contexto
3. A campanha da AEPSA
Propaganda corporativa
Como a AEPSA montou a fraude
4. A doutrinação e o missionário
A pregação de uma doutrina
Argumentação – o sofisma-base
A "Autoridade" para instituir o "dogma"
5. O alegado "estudo"
O documento escondido
A capa
Os conteúdos gerais
Os dados base e os números derivados
"Happy end": a Bibliografia ... e lá se vai o castelo de cartas!
6. O conflito de interesses
7. Interesses, política e privatização dos serviços autárquicos
8. As Autarquias e o direito universal à água e ao saneamento
9. Setembro, 24 a 29 - reforços estrangeiros para boicotar a campanha autárquica
10. Conclusões
11. Notas e Bibliografia
1. Sumário
A AEPSA (associação de negociantes privados de serviços de águas) protagonizou uma acção de propaganda fraudulenta em prol da privatização dos serviços de águas, veiculada por vários jornais e outros meios de disseminação, desde fins de Julho de 2017.
Essa acção faz parte de uma clara interferência programada na campanha das eleições autárquicas, precedendo outra acção de maior vulto, anunciada para fim de Setembro, que trará a Portugal e dará palavra a vários missionários estrangeiros da privatização, com as expectáveis sonantes divulgações nos órgãos de informação a soldo e preenchendo completamente a última semana da campanha autárquica.
Analisam-se e evidenciam-se os interesses e objectivos políticos destas acções, com ênfase para o ataque à democracia, à participação política dos cidadãos e ao Poder Local Autárquico.
Apresentam-se alguns dados sobre o papel insubstituível das Autarquias Locais na garantia do direito universal à água e ao saneamento em Portugal, focando o período em que o abastecimento de água e saneamento foi exclusivamente serviço público e competência autárquica e comparando com a evolução posterior.
Faz-se uma breve contextualização destas iniciativas do cartel de negócios da água, face às crescentes manifestações da população em defesa da água pública e da gestão pública da água e aos múltiplos documentos que demonstram os danos públicos e particulares dos utentes pela privatização dos serviços.
Mostra-se a "prestidigitação" da AEPSA na sua propaganda e como "faz crer" nas suas inverdades.
Faz-se uma breve apreciação do alegado "estudo" possuído pela AEPSA, desmontando algumas das mistificações dele constantes.
Dá-se breve nota e alerta sobre a sequência anunciada, que preencherá a última semana da campanha autárquica, com o mediático evento Porto water innovation week [1] , que, com grandes recursos mobilizados do estrangeiro e com apoio do Governo e participação de detentores de cargos públicos na Administração Central, contará com extensa intervenção de proeminentes missionários estrangeiros da privatização da água e tem já a propaganda mediática garantida pela IMPRESA.
Culmina com a " Mayors & Water Conference 2017 " (Presidentes da Câmara e Água) programada para o dia 29 de Setembro, o dia de fecho da campanha autárquica, assegurando assim a ausência massiva nesse encontro (e silêncio) dos autarcas portugueses.
Sendo o tema aqui exposto demasiado amplo para tratar num artigo e estando várias das matérias pertinentes e factos referidos profusamente documentados, indicam-se em notas de fim várias fontes e bibliografia que possam suprir as inevitáveis superficialidades e omissões.
2. Contexto
Em pré-campanha autárquica, quando cada Câmara e cada candidatura está em foco para avaliação pelos munícipes, a muito generalizada recusa dos portugueses da privatização dos serviços de água tem peso na opção de voto e, portanto, nos debates eleitorais.
Apesar do favorecimento de sucessivos Governos, do controlo pelo capital de importantes meios de comunicação e do bloqueio desses órgãos de "informação" a toda a defesa da água pública, a informação, a consciencialização e a repulsa dos portugueses pela privatização dos serviços de água é muito largamente maioritária.
São cada vez mais conhecidos, não só em Portugal e na Europa mas por todo o Mundo, casos concretos do dano público que advém da transformação dos serviços públicos de água em negócios privados de alguns grupos capitalistas.
A auditoria do Tribunal de Contas em 2014 e o relatório de seguimento em 2015 [2] () comprovam o prejuízo público das privatizações dos serviços de águas, evidenciam o enviesamento dos contractos de concessão para favorecimento ilegítimo dos negócios privados às custas públicas; assinalam também as cumplicidades do Governo e da Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos (ERSAR) nesse favorecimento e na falta de transparência dessas negociatas.
Os escândalos com a concessão do abastecimento de água a Barcelos, a remunicipalização dos serviços de águas de Mafra, entre tantos outros casos, não puderam deixar de ser noticiados.
Desde que se começaram a consolidar as privatizações da água, estes e muitíssimos outros factos, inventários, análises comparadas e estudos, escândalos e casos de tribunal, em Portugal e no estrangeiro, que ilustram os efeitos perversos desses negócios, têm vindo a público e são invocados nos debates e programas autárquicos das forças políticas progressistas.
Curto artigo "Privatização disfarçada sob o manto da concessão" [3] (Pedro Ventura, 2015) apresenta dados relevantes sobre os volumosos encargos públicos com algumas concessões.
Por outro lado, e para citar só um exemplo muito recente, em Julho de 2017 a DECO publicou na revista Proteste nº392 uma "Investigação sobre tarifários de água", que termina com a caixa "Concessões geram tarifas mais caras: (... ) O nosso estuda revela, mais uma vez, que a maioria dos municípios com preços mais elevados pertencem a concessões". (Salvo seja, digo eu, os municípios "pertencem" aos portugueses!)
Em conexão com esse artigo, a DECO disponibilizou no portal da internet uma infografia em que lista os "10 Municípios mais caros por ano (10m3/mês)" [4] . Cruzando dados, evidencia-se que desses dez municípios, os oito primeiros (mais caros) são privatizações do abastecimento de águas e a recolha de águas residuais por concessões a empresas privadas, nomeadamente: Indáqua, AGS, AQUAPOR e BEWG [5] ; o nono é ainda uma concessão, a uma sociedade anónima de capitais públicos e direito privado, a "Águas da Região de Aveiro".
O Projecto de Lei "Protecção dos direitos individuais e comuns à Água" [6] [7] , proposto em 2013 à Assembleia da República por mais de 43 mil cidadãos eleitores, mostra a larga mobilização pela propriedade e gestão pública da água, por órgãos de direito público.
A sua tramitação na Assembleia da República [8] evidencia a fracturação política e ideológica sobre este tema, que contrapõe o interesse dos trabalhadores e da população em geral aos interesses do capital.
Este projecto de Lei transpunha para a legislação nacional o direito à água e ao saneamento nos termos aprovados pela Assembleia da Nações Unidas [9] , em 2010, e travava a privatização da água e do domínio público hídrico, nomeadamente, proibindo novas concessões e a renovação de concessões cessantes e fazendo reverter para entidades de direito público as concessões a empresas e sociedades anónimas de capitais públicos. Cumpria a condição, obrigatória para uma iniciativa legislativa de cidadãos, de não trazer qualquer redução de receitas ou aumento de despesa para o orçamento público.
Foi votado o mesmo texto duas vezes na Assembleia da República, em Outubro de 2014 e novamente, reapresentado pelo PCP e pelo BE, em Dezembro de 2016. Foi em ambas as vezes rejeitado na generalidade por maioria – na primeira vez, pelo PSD e CDS; na segunda vez, quando esses dois partidos somados já não constituíam maioria, pelo PSD, CDS e PS, que também votou contra, quando o seu voto foi necessário para impedir que algum dos artigos do projecto de lei fosse aprovado.
Em Junho de 2017, o relatório de missão a Portugal do Relator Especial das Nações Unidas sobre os direitos humanos à água e saneamento (Report of the Special Rapporteur on the human rights to safe drinking water and sanitation on his mission to Portugal) [10] sublinha que o direito fundamental à água e ao saneamento não está reconhecido na Lei Portuguesa e que esse importante direito não está assegurado universalmente em Portugal. As "conclusões e recomendações" desse relatório centram-se inteiramente em medidas para assegurar a universalidade do direito fundamental à água e ao saneamento, com ênfase para a transposição desse direito para a legislação portuguesa.
É expectável que enquanto a soma de deputados do PSD, do PS e do CDS for maioritária na Assembleia da República, prevaleçam os interesses do cartel dos negócios da água na legislação portuguesa e não seja, por isso, reconhecido em Portugal o direito fundamental à água e ao saneamento.
Mas, como são as Câmaras que têm as atribuições e competências nos serviços de águas, a eleição desses partidos, ou "pseudo-independentes" ao seu serviço, é objectivo central do cartel das águas. Muito em especial, o ataque à CDU (PCP e PEV), cuja forte presença autárquica tem sido o maior obstáculo aos seus negócios.
É em defesa do seu exclusivo interesse de embolso e contra o direito universal à água e ao saneamento, contra o interesse público e contra o interesse particular de todos e cada um dos utentes da água. que a AEPSA vem contradizer os factos públicos e notórios, para, com o seu ruído, enganar o povo e fazer eleger os seus apaniguados nas eleições autárquicas.
3. A campanha da AEPSA
Propaganda corporativa
Em fins de Julho deste ano, já em plena pré-campanha de eleições autárquicas, diversos órgãos de comunicação, pertencentes a fortes grupos económicos que actuam em Portugal, publicitaram propaganda falsa pela privatização dos serviços públicos de água, difamando os serviços públicos de águas e deturpando a história dos serviços públicos de abastecimento de água e saneamento em Portugal.
Trata-se de propaganda corporativa, que a Wikipédia define assim:
2. Contexto
3. A campanha da AEPSA
Propaganda corporativa
Como a AEPSA montou a fraude
4. A doutrinação e o missionário
A pregação de uma doutrina
Argumentação – o sofisma-base
A "Autoridade" para instituir o "dogma"
5. O alegado "estudo"
O documento escondido
A capa
Os conteúdos gerais
Os dados base e os números derivados
"Happy end": a Bibliografia ... e lá se vai o castelo de cartas!
6. O conflito de interesses
7. Interesses, política e privatização dos serviços autárquicos
8. As Autarquias e o direito universal à água e ao saneamento
9. Setembro, 24 a 29 - reforços estrangeiros para boicotar a campanha autárquica
10. Conclusões
11. Notas e Bibliografia
1. Sumário
A AEPSA (associação de negociantes privados de serviços de águas) protagonizou uma acção de propaganda fraudulenta em prol da privatização dos serviços de águas, veiculada por vários jornais e outros meios de disseminação, desde fins de Julho de 2017.
Essa acção faz parte de uma clara interferência programada na campanha das eleições autárquicas, precedendo outra acção de maior vulto, anunciada para fim de Setembro, que trará a Portugal e dará palavra a vários missionários estrangeiros da privatização, com as expectáveis sonantes divulgações nos órgãos de informação a soldo e preenchendo completamente a última semana da campanha autárquica.
Analisam-se e evidenciam-se os interesses e objectivos políticos destas acções, com ênfase para o ataque à democracia, à participação política dos cidadãos e ao Poder Local Autárquico.
Apresentam-se alguns dados sobre o papel insubstituível das Autarquias Locais na garantia do direito universal à água e ao saneamento em Portugal, focando o período em que o abastecimento de água e saneamento foi exclusivamente serviço público e competência autárquica e comparando com a evolução posterior.
Faz-se uma breve contextualização destas iniciativas do cartel de negócios da água, face às crescentes manifestações da população em defesa da água pública e da gestão pública da água e aos múltiplos documentos que demonstram os danos públicos e particulares dos utentes pela privatização dos serviços.
Mostra-se a "prestidigitação" da AEPSA na sua propaganda e como "faz crer" nas suas inverdades.
Faz-se uma breve apreciação do alegado "estudo" possuído pela AEPSA, desmontando algumas das mistificações dele constantes.
Dá-se breve nota e alerta sobre a sequência anunciada, que preencherá a última semana da campanha autárquica, com o mediático evento Porto water innovation week [1] , que, com grandes recursos mobilizados do estrangeiro e com apoio do Governo e participação de detentores de cargos públicos na Administração Central, contará com extensa intervenção de proeminentes missionários estrangeiros da privatização da água e tem já a propaganda mediática garantida pela IMPRESA.
Culmina com a " Mayors & Water Conference 2017 " (Presidentes da Câmara e Água) programada para o dia 29 de Setembro, o dia de fecho da campanha autárquica, assegurando assim a ausência massiva nesse encontro (e silêncio) dos autarcas portugueses.
Sendo o tema aqui exposto demasiado amplo para tratar num artigo e estando várias das matérias pertinentes e factos referidos profusamente documentados, indicam-se em notas de fim várias fontes e bibliografia que possam suprir as inevitáveis superficialidades e omissões.
2. Contexto
Em pré-campanha autárquica, quando cada Câmara e cada candidatura está em foco para avaliação pelos munícipes, a muito generalizada recusa dos portugueses da privatização dos serviços de água tem peso na opção de voto e, portanto, nos debates eleitorais.
Apesar do favorecimento de sucessivos Governos, do controlo pelo capital de importantes meios de comunicação e do bloqueio desses órgãos de "informação" a toda a defesa da água pública, a informação, a consciencialização e a repulsa dos portugueses pela privatização dos serviços de água é muito largamente maioritária.
São cada vez mais conhecidos, não só em Portugal e na Europa mas por todo o Mundo, casos concretos do dano público que advém da transformação dos serviços públicos de água em negócios privados de alguns grupos capitalistas.
A auditoria do Tribunal de Contas em 2014 e o relatório de seguimento em 2015 [2] () comprovam o prejuízo público das privatizações dos serviços de águas, evidenciam o enviesamento dos contractos de concessão para favorecimento ilegítimo dos negócios privados às custas públicas; assinalam também as cumplicidades do Governo e da Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos (ERSAR) nesse favorecimento e na falta de transparência dessas negociatas.
Os escândalos com a concessão do abastecimento de água a Barcelos, a remunicipalização dos serviços de águas de Mafra, entre tantos outros casos, não puderam deixar de ser noticiados.
Desde que se começaram a consolidar as privatizações da água, estes e muitíssimos outros factos, inventários, análises comparadas e estudos, escândalos e casos de tribunal, em Portugal e no estrangeiro, que ilustram os efeitos perversos desses negócios, têm vindo a público e são invocados nos debates e programas autárquicos das forças políticas progressistas.
Curto artigo "Privatização disfarçada sob o manto da concessão" [3] (Pedro Ventura, 2015) apresenta dados relevantes sobre os volumosos encargos públicos com algumas concessões.
Por outro lado, e para citar só um exemplo muito recente, em Julho de 2017 a DECO publicou na revista Proteste nº392 uma "Investigação sobre tarifários de água", que termina com a caixa "Concessões geram tarifas mais caras: (... ) O nosso estuda revela, mais uma vez, que a maioria dos municípios com preços mais elevados pertencem a concessões". (Salvo seja, digo eu, os municípios "pertencem" aos portugueses!)
Em conexão com esse artigo, a DECO disponibilizou no portal da internet uma infografia em que lista os "10 Municípios mais caros por ano (10m3/mês)" [4] . Cruzando dados, evidencia-se que desses dez municípios, os oito primeiros (mais caros) são privatizações do abastecimento de águas e a recolha de águas residuais por concessões a empresas privadas, nomeadamente: Indáqua, AGS, AQUAPOR e BEWG [5] ; o nono é ainda uma concessão, a uma sociedade anónima de capitais públicos e direito privado, a "Águas da Região de Aveiro".
O Projecto de Lei "Protecção dos direitos individuais e comuns à Água" [6] [7] , proposto em 2013 à Assembleia da República por mais de 43 mil cidadãos eleitores, mostra a larga mobilização pela propriedade e gestão pública da água, por órgãos de direito público.
A sua tramitação na Assembleia da República [8] evidencia a fracturação política e ideológica sobre este tema, que contrapõe o interesse dos trabalhadores e da população em geral aos interesses do capital.
Este projecto de Lei transpunha para a legislação nacional o direito à água e ao saneamento nos termos aprovados pela Assembleia da Nações Unidas [9] , em 2010, e travava a privatização da água e do domínio público hídrico, nomeadamente, proibindo novas concessões e a renovação de concessões cessantes e fazendo reverter para entidades de direito público as concessões a empresas e sociedades anónimas de capitais públicos. Cumpria a condição, obrigatória para uma iniciativa legislativa de cidadãos, de não trazer qualquer redução de receitas ou aumento de despesa para o orçamento público.
Foi votado o mesmo texto duas vezes na Assembleia da República, em Outubro de 2014 e novamente, reapresentado pelo PCP e pelo BE, em Dezembro de 2016. Foi em ambas as vezes rejeitado na generalidade por maioria – na primeira vez, pelo PSD e CDS; na segunda vez, quando esses dois partidos somados já não constituíam maioria, pelo PSD, CDS e PS, que também votou contra, quando o seu voto foi necessário para impedir que algum dos artigos do projecto de lei fosse aprovado.
Em Junho de 2017, o relatório de missão a Portugal do Relator Especial das Nações Unidas sobre os direitos humanos à água e saneamento (Report of the Special Rapporteur on the human rights to safe drinking water and sanitation on his mission to Portugal) [10] sublinha que o direito fundamental à água e ao saneamento não está reconhecido na Lei Portuguesa e que esse importante direito não está assegurado universalmente em Portugal. As "conclusões e recomendações" desse relatório centram-se inteiramente em medidas para assegurar a universalidade do direito fundamental à água e ao saneamento, com ênfase para a transposição desse direito para a legislação portuguesa.
É expectável que enquanto a soma de deputados do PSD, do PS e do CDS for maioritária na Assembleia da República, prevaleçam os interesses do cartel dos negócios da água na legislação portuguesa e não seja, por isso, reconhecido em Portugal o direito fundamental à água e ao saneamento.
Mas, como são as Câmaras que têm as atribuições e competências nos serviços de águas, a eleição desses partidos, ou "pseudo-independentes" ao seu serviço, é objectivo central do cartel das águas. Muito em especial, o ataque à CDU (PCP e PEV), cuja forte presença autárquica tem sido o maior obstáculo aos seus negócios.
É em defesa do seu exclusivo interesse de embolso e contra o direito universal à água e ao saneamento, contra o interesse público e contra o interesse particular de todos e cada um dos utentes da água. que a AEPSA vem contradizer os factos públicos e notórios, para, com o seu ruído, enganar o povo e fazer eleger os seus apaniguados nas eleições autárquicas.
3. A campanha da AEPSA
Propaganda corporativa
Em fins de Julho deste ano, já em plena pré-campanha de eleições autárquicas, diversos órgãos de comunicação, pertencentes a fortes grupos económicos que actuam em Portugal, publicitaram propaganda falsa pela privatização dos serviços públicos de água, difamando os serviços públicos de águas e deturpando a história dos serviços públicos de abastecimento de água e saneamento em Portugal.
Trata-se de propaganda corporativa, que a Wikipédia define assim:
"Propaganda Corporativa (Corporate Propaganda) refere-se à propaganda disseminada por uma empresa (ou empresas) com o objectivo de manipular a opinião pública em relação a essa empresa, e suas actividades.
O uso da propaganda corporativa pode ser frequentemente encontrado nos campos de publicidade, "marketing", política, história e relações públicas". [...] [11]
O cartel de empresários dos negócios monopolistas da água montou esta campanha de propaganda corporativa com o objectivo de manipular a opinião pública em relação a esse cartel , e suas actividades (os negócios monopolistas privados com a água e serviços públicos).
A campanha visa simultaneamente os cinco campos listados na Wikipédia, manipulando a opinião pública nomeadamente: com publicidade enganosa e "marketing" dos produtos e serviços que vendem, interferênciapolítica na agenda de privatização da água e no processo das eleições autárquicas, deturpação da história do abastecimento de água e saneamento em Portugal e relações públicas para tentar minimizar a contestação muito generalizada dos portugueses à imposição das suas "actividades", "produtos" e "serviços".
Propagandeiam a "superioridade" e "menores custos públicos" das concessões a privados, denegrindo os resultados positivos dos serviços públicos, a pretexto de um misterioso estudo, alegadamente contratado ao IST, que provaria todas as alarvices que são desbocadas pelos negociantes da água e pelos grupos políticos que os apoiam.
Ora, o que é facto provado e documentado é que as concessões existentes em Portugal de serviços de águas e esgotos a privados são gravemente dolosas para o Orçamento Público e resultam em tarifários mais elevados para os utentes, sem nenhum benefício em qualidade de serviço.
O alegado estudo do Instituto Superior Técnico é o "escrito" de uma pessoa só, que assume em exclusividade a sua autoria. E, dissonância de salientar, afinal esse escrito não mostra coisa nenhuma do apregoado.
É uma fraude protagonizada pela AEPSA (associação dos empresários privados dos negócios da água em Portugal) e veiculada pelos grupos económicos que controlam grandes meios de comunicação, com a cumplicidade de alguns serviçais desses interesses de capital que ocupam cargos públicos.
É provável que esta acção tenha pouco impacto directo na opinião pública dos portugueses, que muito maioritariamente e cada vez em maior número se têm oposto à privatização dos serviços de água e que são insultados no discurso emproado e falso dos negociantes da água e seus missionários remunerados.
Mas esta é uma acção ainda incipiente de pré-campanha, tendo já sido anunciada a grande acção de campanha – a " Porto Innovation Water Week ", com o mesmo fim, de muito maior impacto mediático e com grandes recursos mobilizados, que decorrerá no Porto de 24 a 29 de Setembro, os últimos dias de Campanha.
Com apoio do Governo e participação de detentores de cargos públicos na Administração Central, contará com extensa intervenção de proeminentes missionários estrangeiros da privatização da água, em especial da privatização dos serviços de água: uns do lobby político na CE, outros com cargos sonantes no cartel dos negócios da água. Culmina com a " Mayors & Water Conference 2017 " (Presidentes da Câmara e Água) programada para o dia 29 de Setembro, o dia de fecho da campanha autárquica, assegurando assim a ausência massiva (e silêncio) dos autarcas portugueses.
Para encher os jornais e televisões, no "dia de reflexão", de ataques às competências autárquicas e propaganda importada em prol da privatização e empresarialização dos serviços de água.
Este é um exemplar caso de estudo do "modo de operação" comum ao cartel dos grandes grupos económicos que negoceiam coisas públicas e, neste caso, a água.
A instalação da máquina de propaganda corporativa, manipuladora e baseada na apresentação como "autoridade científica" de pseudo-estudos e argumentários falseando os factos com fortíssima componente ideológica de propaganda ao "mercado livre" capitalista, proliferou em crescendo nas últimas décadas do século passado e nos primeiros anos do século XXI.
Esta matéria, em conexão com a manipulação e corrupção política, é aprofundada e profusamente documentada em várias obras da autora australiana Sharon Beder, em particular nos livros publicados em 2006 "Suiting themselves – How Corporations Drive The Global Agenda" e "Free Market Missionairies – The corporate manipulation of comunity values" [12] [13] [14]
É essa faceta de actuação política dos privatizadores da água que releva expor e desmontar.
Como a AEPSA montou a fraude
A AEPSA (associação dos empresários privados dos negócios de serviços de águas e resíduos urbanos em Portugal) comprou um "estudo" cujos resultados pré-determinaram, bem como a declaração desses "resultados" à imprensa.
"Diz" o jornal O Público que essa compra terá sido feita através de um contracto, cujo teor não é conhecido, com o Instituto Superior Técnico (IST). Nada o confirma, mas também não foi desmentido.
A instituição IST não subscreve nem avaliza o documento produzido: nem como autor, nem como editor, nem com um "visto" de qualquer conselho, órgão científico ou dirigente, nem é noticiada sequer qualquer presença ou representação institucional desse organismo na apresentação do referido estudo.
Então, caso haja algum contracto (o que ponho em dúvida), o IST será apenas um intermediário comercial, que cobra comissão sobre a prestação individual de um seu assalariado, sem qualquer envolvimento científico ou controlo de qualidade sobre essa prestação.
O "estudo" é assinado por autor único, que é também único a assumi-lo publicamente – Rui Domingos Ribeiro da Cunha Marques , que lecciona no Instituto Superior Técnico algumas disciplinas que nada têm a ver com abastecimento de água ou saneamento [15] .
Exerce também actividade esporádica em duas escolas de negócios [16] , nos EUA e Austrália, afirma-se consultor do Banco Mundial e oferece serviços de consultoria.
A informação sobre as áreas de qualificação académica é muito vaga, mas as privatizações são explícitas nas suas "áreas de interesse" e a lista de publicações e consultorias indicia claramente a especialização em propagandear negócios, muito especialmente negócios privados com coisas públicas.
Claramente, exerce a rendosa "profissão" que dá o título ao livro de Sharon Beder, "Missionário do Mercado Livre".
O autor único produz o tal "estudo", que a AEPSA resguarda muito bem do exame público.
Se o "estudo" de facto demonstrasse, ou contribuísse minimamente para demonstrar, alguma vantagem pública das privatizações da água, se, pelo menos minimamente, contradissesse os muitos danos largamente documentados, se sustentasse, mesmo fracamente, o argumentário privatizador, seria imediatamente afixado na internet, propagandeado e tornado acessível ao público em grande escala.
Assim e pelo contrário, teve uma distribuição restritíssima, num formato muito dificilmente reprodutível. E é uma leitura intragável. Dos selectos presenteados, para além dos empresários da AEPSA, não se encontra nenhum que publicamente confesse ter lido, ou sequer folheado, o "estudo".
É óbvio que, mesmo assim, é muito inconveniente para a AEPSA "mostrar" o estudo.
A estratégia foi propagandear que "possuem um estudo do IST" intitulado "Análise do Desempenho dos Operadores Privados e Públicos no Sector da Água em Portugal" e que esse estudo "demonstra" tal e tal coisa.
Fazem uma cerimónia restrita de apresentação no Centro de Congressos do CCB, para a qual asseguram a presença de alguns personagens favoráveis à privatização da água.
O Público, órgão da SONAE, produz a peça base de propaganda para os meios de comunicação:
A campanha visa simultaneamente os cinco campos listados na Wikipédia, manipulando a opinião pública nomeadamente: com publicidade enganosa e "marketing" dos produtos e serviços que vendem, interferênciapolítica na agenda de privatização da água e no processo das eleições autárquicas, deturpação da história do abastecimento de água e saneamento em Portugal e relações públicas para tentar minimizar a contestação muito generalizada dos portugueses à imposição das suas "actividades", "produtos" e "serviços".
Propagandeiam a "superioridade" e "menores custos públicos" das concessões a privados, denegrindo os resultados positivos dos serviços públicos, a pretexto de um misterioso estudo, alegadamente contratado ao IST, que provaria todas as alarvices que são desbocadas pelos negociantes da água e pelos grupos políticos que os apoiam.
Ora, o que é facto provado e documentado é que as concessões existentes em Portugal de serviços de águas e esgotos a privados são gravemente dolosas para o Orçamento Público e resultam em tarifários mais elevados para os utentes, sem nenhum benefício em qualidade de serviço.
O alegado estudo do Instituto Superior Técnico é o "escrito" de uma pessoa só, que assume em exclusividade a sua autoria. E, dissonância de salientar, afinal esse escrito não mostra coisa nenhuma do apregoado.
É uma fraude protagonizada pela AEPSA (associação dos empresários privados dos negócios da água em Portugal) e veiculada pelos grupos económicos que controlam grandes meios de comunicação, com a cumplicidade de alguns serviçais desses interesses de capital que ocupam cargos públicos.
É provável que esta acção tenha pouco impacto directo na opinião pública dos portugueses, que muito maioritariamente e cada vez em maior número se têm oposto à privatização dos serviços de água e que são insultados no discurso emproado e falso dos negociantes da água e seus missionários remunerados.
Mas esta é uma acção ainda incipiente de pré-campanha, tendo já sido anunciada a grande acção de campanha – a " Porto Innovation Water Week ", com o mesmo fim, de muito maior impacto mediático e com grandes recursos mobilizados, que decorrerá no Porto de 24 a 29 de Setembro, os últimos dias de Campanha.
Com apoio do Governo e participação de detentores de cargos públicos na Administração Central, contará com extensa intervenção de proeminentes missionários estrangeiros da privatização da água, em especial da privatização dos serviços de água: uns do lobby político na CE, outros com cargos sonantes no cartel dos negócios da água. Culmina com a " Mayors & Water Conference 2017 " (Presidentes da Câmara e Água) programada para o dia 29 de Setembro, o dia de fecho da campanha autárquica, assegurando assim a ausência massiva (e silêncio) dos autarcas portugueses.
Para encher os jornais e televisões, no "dia de reflexão", de ataques às competências autárquicas e propaganda importada em prol da privatização e empresarialização dos serviços de água.
Este é um exemplar caso de estudo do "modo de operação" comum ao cartel dos grandes grupos económicos que negoceiam coisas públicas e, neste caso, a água.
A instalação da máquina de propaganda corporativa, manipuladora e baseada na apresentação como "autoridade científica" de pseudo-estudos e argumentários falseando os factos com fortíssima componente ideológica de propaganda ao "mercado livre" capitalista, proliferou em crescendo nas últimas décadas do século passado e nos primeiros anos do século XXI.
Esta matéria, em conexão com a manipulação e corrupção política, é aprofundada e profusamente documentada em várias obras da autora australiana Sharon Beder, em particular nos livros publicados em 2006 "Suiting themselves – How Corporations Drive The Global Agenda" e "Free Market Missionairies – The corporate manipulation of comunity values" [12] [13] [14]
É essa faceta de actuação política dos privatizadores da água que releva expor e desmontar.
Como a AEPSA montou a fraude
A AEPSA (associação dos empresários privados dos negócios de serviços de águas e resíduos urbanos em Portugal) comprou um "estudo" cujos resultados pré-determinaram, bem como a declaração desses "resultados" à imprensa.
"Diz" o jornal O Público que essa compra terá sido feita através de um contracto, cujo teor não é conhecido, com o Instituto Superior Técnico (IST). Nada o confirma, mas também não foi desmentido.
A instituição IST não subscreve nem avaliza o documento produzido: nem como autor, nem como editor, nem com um "visto" de qualquer conselho, órgão científico ou dirigente, nem é noticiada sequer qualquer presença ou representação institucional desse organismo na apresentação do referido estudo.
Então, caso haja algum contracto (o que ponho em dúvida), o IST será apenas um intermediário comercial, que cobra comissão sobre a prestação individual de um seu assalariado, sem qualquer envolvimento científico ou controlo de qualidade sobre essa prestação.
O "estudo" é assinado por autor único, que é também único a assumi-lo publicamente – Rui Domingos Ribeiro da Cunha Marques , que lecciona no Instituto Superior Técnico algumas disciplinas que nada têm a ver com abastecimento de água ou saneamento [15] .
Exerce também actividade esporádica em duas escolas de negócios [16] , nos EUA e Austrália, afirma-se consultor do Banco Mundial e oferece serviços de consultoria.
A informação sobre as áreas de qualificação académica é muito vaga, mas as privatizações são explícitas nas suas "áreas de interesse" e a lista de publicações e consultorias indicia claramente a especialização em propagandear negócios, muito especialmente negócios privados com coisas públicas.
Claramente, exerce a rendosa "profissão" que dá o título ao livro de Sharon Beder, "Missionário do Mercado Livre".
O autor único produz o tal "estudo", que a AEPSA resguarda muito bem do exame público.
Se o "estudo" de facto demonstrasse, ou contribuísse minimamente para demonstrar, alguma vantagem pública das privatizações da água, se, pelo menos minimamente, contradissesse os muitos danos largamente documentados, se sustentasse, mesmo fracamente, o argumentário privatizador, seria imediatamente afixado na internet, propagandeado e tornado acessível ao público em grande escala.
Assim e pelo contrário, teve uma distribuição restritíssima, num formato muito dificilmente reprodutível. E é uma leitura intragável. Dos selectos presenteados, para além dos empresários da AEPSA, não se encontra nenhum que publicamente confesse ter lido, ou sequer folheado, o "estudo".
É óbvio que, mesmo assim, é muito inconveniente para a AEPSA "mostrar" o estudo.
A estratégia foi propagandear que "possuem um estudo do IST" intitulado "Análise do Desempenho dos Operadores Privados e Públicos no Sector da Água em Portugal" e que esse estudo "demonstra" tal e tal coisa.
Fazem uma cerimónia restrita de apresentação no Centro de Congressos do CCB, para a qual asseguram a presença de alguns personagens favoráveis à privatização da água.
O Público, órgão da SONAE, produz a peça base de propaganda para os meios de comunicação:
- Cita profusamente o autor do estudo, Rui Cunha Marques, pregando ex catedra , várias alegações não fundamentadas. uma série de afirmações estafadas do discurso político privatizador, debitando uma profusão de números convenientes surgidos do nada e que remete para o seu "estudo"; declara que "são vários os estudos internacionais – incluindo de prémios Nobel" (não identificados) que reconhecem tal e tal superioridade dos operadores privados sobre o serviço público.
- Cita abundantemente o director(?) da AEPSA, Francisco de Mariz Machado, que emite as opiniões e argumentos que era de esperar dos beneficiários dos lucrativos negócios da água.
- Cita o secretário de Estado do Ambiente, Carlos Martins, que não manifesta ter lido o "estudo", mas repete argumentos favoráveis à privatização da água, que, como é bastamente sabido, tem sido prática continuada do PS na Assembleia da República, no Governo e nas Autarquias, contra a vontade da maioria do seu eleitorado e é, por isso, uma pedra no sapato desse partido nestas eleições autárquicas.
Nada de novo e que não tenha sido já profusamente rebatido e desmentido pelos factos reais.
Pretendem impor a fábula como dogma, contra a lógica e contra os factos, invocando "Autoridades": o alegado estudo atribuído ao Instituto Superior Técnico, os invocados mitos de "estudos internacionais" e "prémios Nobel" não citados nem identificados, o discurso político enviesado do secretário de estado.
A peça propagandística de O Público é publicada em 24 de Julho de 2017 com o título "Estudo do IST diz que privados são melhores a gerir a água" e passa a substituir o "estudo" não divulgado. É repercutida e amplificada nos órgãos de comunicação ao serviço do capital e nos portais dos empresários dos negócios da água, com espampanantes títulos tais como:
Pretendem impor a fábula como dogma, contra a lógica e contra os factos, invocando "Autoridades": o alegado estudo atribuído ao Instituto Superior Técnico, os invocados mitos de "estudos internacionais" e "prémios Nobel" não citados nem identificados, o discurso político enviesado do secretário de estado.
A peça propagandística de O Público é publicada em 24 de Julho de 2017 com o título "Estudo do IST diz que privados são melhores a gerir a água" e passa a substituir o "estudo" não divulgado. É repercutida e amplificada nos órgãos de comunicação ao serviço do capital e nos portais dos empresários dos negócios da água, com espampanantes títulos tais como:
- TVI24: "Água: privados com melhor serviço e mais barato"
- Jornal Água e Ambiente (ligado à AEPSA): Água: privados são mais eficientes, revela estudo
- Jornal de Negócios: Estudo: Sector privado da água é mais eficaz e presta melhor qualidade de serviço
O DISSE QUE DISSE
Finalmente, jornais e televisões disseram que O Público disse que um Professor disse que fez um estudo que diz tais e tais coisas.
Neste disse que disse , e como "quem conta um conto acrescenta um ponto", cada vez dizem mais maravilhas dos negócios privados com a água pública. Reacção em cadeia, que permite a cada propagandista escudar-se em ditos alheios para difundir as falsidades que lhes convém.
A chave desta operação é fazer o povo acreditar num conjunto de patranhas exclusivamente pela féna veracidade do missionário.
Os vendedores de remédios mágicos para todos os males, que do alto da carroça reuniam gentes a quem citavam dezenas curas repentinas das doenças, ex-calvos com cabeleiras exuberantes após algumas aplicações, os furúnculos curados do Bispo tal, as feridas saradas de cicrano, o rejuvenescimento de beltrano ... muitos números, nomes e factos. Em acreditando , compra-se obviamente a mistela miraculosa.
Os "contos de vigário", em todas as suas variantes, reinventadas e renovadas através dos tempos, são sempre protagonizados pelo "vigarista" e um ou mais, "papalvos". O "vigarista", com uma aparência insuspeita, conta uma história fora do vulgar citando factos e testemunhos e o papalvo é burlado se acredita no vigarista. Quantas vezes se queixa depois: "mas era um senhor tão sério e bem-educado, explicou tudo tão bem, mostrou-me documentos..." Casos assim vemos imensas vezes nas notícias, pelos mais aberrantes motivos.
É uma operação de manipulação da opinião pública pelo cartel dos negociantes da água.
Com o objectivo óbvio de influenciar o voto nas eleições autárquicas e de escudar as forças políticas que, contra a vontade expressa das populações, têm vindo a privatizar a água pública.
4. A doutrinação e o missionário
A pregação de uma doutrina
O cartel das empresas da água pretende impingir ao povo uma doutrina , com seus artigos de fé.
Nada de novo. É a doutrina do capitalismo financeiro puro e duro, o imperialismo, [17] , a propaganda de imposição de uma "ordem mundial" oligárquica, governada pelo capital financeiro [18] em oposição à democracia. Com os seus eufemismos de um tal "mercado", que de facto é a acumulação e concentração de capital e poder num grupo cada vez mais restrito de enormes capitalistas transnacionais [19] .
Neste caso em concreto, focam a privatização da água e a abolição dos serviços de água em prol da concentração de capital no cartel dos negociantes da água.
Salientam-se as seguintes linhas doutrinárias:
Finalmente, jornais e televisões disseram que O Público disse que um Professor disse que fez um estudo que diz tais e tais coisas.
Neste disse que disse , e como "quem conta um conto acrescenta um ponto", cada vez dizem mais maravilhas dos negócios privados com a água pública. Reacção em cadeia, que permite a cada propagandista escudar-se em ditos alheios para difundir as falsidades que lhes convém.
A chave desta operação é fazer o povo acreditar num conjunto de patranhas exclusivamente pela féna veracidade do missionário.
Os vendedores de remédios mágicos para todos os males, que do alto da carroça reuniam gentes a quem citavam dezenas curas repentinas das doenças, ex-calvos com cabeleiras exuberantes após algumas aplicações, os furúnculos curados do Bispo tal, as feridas saradas de cicrano, o rejuvenescimento de beltrano ... muitos números, nomes e factos. Em acreditando , compra-se obviamente a mistela miraculosa.
Os "contos de vigário", em todas as suas variantes, reinventadas e renovadas através dos tempos, são sempre protagonizados pelo "vigarista" e um ou mais, "papalvos". O "vigarista", com uma aparência insuspeita, conta uma história fora do vulgar citando factos e testemunhos e o papalvo é burlado se acredita no vigarista. Quantas vezes se queixa depois: "mas era um senhor tão sério e bem-educado, explicou tudo tão bem, mostrou-me documentos..." Casos assim vemos imensas vezes nas notícias, pelos mais aberrantes motivos.
É uma operação de manipulação da opinião pública pelo cartel dos negociantes da água.
Com o objectivo óbvio de influenciar o voto nas eleições autárquicas e de escudar as forças políticas que, contra a vontade expressa das populações, têm vindo a privatizar a água pública.
4. A doutrinação e o missionário
A pregação de uma doutrina
O cartel das empresas da água pretende impingir ao povo uma doutrina , com seus artigos de fé.
Nada de novo. É a doutrina do capitalismo financeiro puro e duro, o imperialismo, [17] , a propaganda de imposição de uma "ordem mundial" oligárquica, governada pelo capital financeiro [18] em oposição à democracia. Com os seus eufemismos de um tal "mercado", que de facto é a acumulação e concentração de capital e poder num grupo cada vez mais restrito de enormes capitalistas transnacionais [19] .
Neste caso em concreto, focam a privatização da água e a abolição dos serviços de água em prol da concentração de capital no cartel dos negociantes da água.
Salientam-se as seguintes linhas doutrinárias:
- a "deificação" do "mercado da água" eliminando o "direito à água e ao saneamento"
- a eliminação dos serviços de água a substituir por "negócios rentáveis da água"
- a subida dos tarifários e facturação da água por imposição da Administração Central, assimilando-os aos "mais rentáveis", a título de "igualdade" e "prosperidade do mercado", para eliminar os efeitos das diferenças mais óbvias de políticas autárquicas e as diferenças evidentes entre serviço público e negócio.
- a transferência de capitais públicos para as empresas privadas, "a bem do mercado".
Assinala-se ainda a insistência em repetir que "concessão não é privatização".
Quando se fala de privatização da água trata-se geralmente de concessão, é a forma de privatização mais corrente.
Creio que não há dúvidas e não vale a pena detalhar. Mas quem não estiver suficientemente esclarecido, pode consultar, além do artigo de Pedro Ventura, 2015, já acima mencionado, dois textos de intervenções na"mesa redonda: Privatização e concessão da água, há diferença?" organizada pela Fundação de Serralves e LPN, [20] ; num artigo de 2002, "A Fronteira da Água" [21] expus já esta e outras formas menos visíveis de privatização da água, inserindo-as na luta pelo poder das muito grandes multinacionais.
Argumentação– o sofisma-base
A AEPSA é uma associação de interesses de negociantes privados da água. Esses interesses são contrários aos interesses de todas as restantes pessoas, como utentes e como pagantes – da água, dos serviços de águas e de todos os outros serviços e prestações do Estado e das Autarquias (para além de muitos outros interesses e direitos que não vou referir aqui).
Isto não é nenhuma teoria abstracta. É bastante evidente por dedução, mas, estando infelizmente em prática uma quantidade de privatizações e havendo também longa vivência de bons serviços públicos, milhares de dados reais e centenas de casos de estudo, em todo o mundo e em Portugal, é uma constatação de factos que as privatizações dos serviços de água são muito danosas para os utentes, são ruinosas para as finanças autárquicas e gravosas para o orçamento público. Dados, análises profundas dos casos reais, escândalos sobre escândalos.
Assim, é cada vez mais generalizada a consciência social desses prejuízos para a população em geral. Esta consciencialização tem efeitos políticos, nomeadamente, e não só, porque decisões obviamente contra os interesses dos eleitores têm custos eleitorais, especialmente nas eleições autárquicas.
O conflito de interesses centra-se em "de onde para onde" corre o dinheiro e a riqueza:
Quando se fala de privatização da água trata-se geralmente de concessão, é a forma de privatização mais corrente.
Creio que não há dúvidas e não vale a pena detalhar. Mas quem não estiver suficientemente esclarecido, pode consultar, além do artigo de Pedro Ventura, 2015, já acima mencionado, dois textos de intervenções na"mesa redonda: Privatização e concessão da água, há diferença?" organizada pela Fundação de Serralves e LPN, [20] ; num artigo de 2002, "A Fronteira da Água" [21] expus já esta e outras formas menos visíveis de privatização da água, inserindo-as na luta pelo poder das muito grandes multinacionais.
Argumentação– o sofisma-base
A AEPSA é uma associação de interesses de negociantes privados da água. Esses interesses são contrários aos interesses de todas as restantes pessoas, como utentes e como pagantes – da água, dos serviços de águas e de todos os outros serviços e prestações do Estado e das Autarquias (para além de muitos outros interesses e direitos que não vou referir aqui).
Isto não é nenhuma teoria abstracta. É bastante evidente por dedução, mas, estando infelizmente em prática uma quantidade de privatizações e havendo também longa vivência de bons serviços públicos, milhares de dados reais e centenas de casos de estudo, em todo o mundo e em Portugal, é uma constatação de factos que as privatizações dos serviços de água são muito danosas para os utentes, são ruinosas para as finanças autárquicas e gravosas para o orçamento público. Dados, análises profundas dos casos reais, escândalos sobre escândalos.
Assim, é cada vez mais generalizada a consciência social desses prejuízos para a população em geral. Esta consciencialização tem efeitos políticos, nomeadamente, e não só, porque decisões obviamente contra os interesses dos eleitores têm custos eleitorais, especialmente nas eleições autárquicas.
O conflito de interesses centra-se em "de onde para onde" corre o dinheiro e a riqueza:
- de um lado, as fortunas privadas dos negociantes da água;
- do outro lado, os rendimentos particulares dos milhões de pessoas mais os bens comuns e os dinheiros públicos que lhes pertencem colectivamente e deviam ser equitativamente usados e postos ao serviço do bem-estar e qualidade de vida desses milhões de pessoas.
- a riqueza corre de lá para cá, ou de cá para lá. São sentidos opostos.
Portanto, o que é "bom" para a cartel dos negócios da água é "mau" para os utentes. E vice-versa.
A acção da AEPSA incide exclusivamente em confundir os eleitores sobre este antagonismo, para que votem contra si próprios, ou para que se abstenham de votar; e para que aceitem os políticos corruptos que utilizam o poder concedido pelo voto para favorecer os interesses antagónicos aos dos seus eleitores (e aos de quem votou noutros, mas come por tabela).
Propagam para isso uma DOUTRINA absolutista, que parte de um postulado que oblitera o antagonismo:
A acção da AEPSA incide exclusivamente em confundir os eleitores sobre este antagonismo, para que votem contra si próprios, ou para que se abstenham de votar; e para que aceitem os políticos corruptos que utilizam o poder concedido pelo voto para favorecer os interesses antagónicos aos dos seus eleitores (e aos de quem votou noutros, mas come por tabela).
Propagam para isso uma DOUTRINA absolutista, que parte de um postulado que oblitera o antagonismo:
- OU a privatização é MÁ
- OU a privatização é BOA
Em absoluto, como se a transferência de riqueza de uns para outros pudesse alguma vez ser "boa" ou "má" para ambos os lados em simultâneo.
Daí, sempre omitindo o sujeito, desenvolvem as vantagens para o cartel dos concessionários, ou seja, que é um negócio muito rentável com lucros sempre garantidos muito superiores aos custos.
Mostram também que o serviço público arrecada menos lucros.
Logo, o negócio privado "é melhor".
Logo, concluem que a privatização é "boa".
Se é "boa" não pode ser "má". Logo, é falso que seja "má" ... e por aí afora.
Este raciocínio é um sofisma [22] , ou refutação sofística, uma técnica de argumentação de má fé para defender algo falso e confundir o contraditor.
A técnica do sofisma vem sendo estudada e utilizada há dois milénios e meio, sempre desenvolvida e apurada com requintes de circunvoluções e repetições para confundir a contra-argumentação.
O objectivo é induzir o contraditor menos treinado a contestar as qualidades atribuídas à privatização, ou seja, contestar os detalhes de que é "um excelente negócio"; e logo aí fica perdido, porque é incontestavelmente um negócio milionário.
O que tem de ser desmontado é o vício do raciocínio, escondendo o conflito de interesses e evidenciando as "qualidades" para um grupo de interesses, ou classe, como se fossem também "qualidades" para o grupo antagónico, que são, no caso presente, todas as outras classes.
Ou seja: "Sim, a privatização da água é um negócio muito rentável e "eficiente". Põe muito dinheiro nasua conta; e quanto melhor negócio e mais rendoso é para si, mais danoso para mim, porque é o meudinheiro que abastece a sua conta".
É uma fraude comparar o cash-flow do concessionário com o cash-flow da Autarquia que presta directamente os serviços.
Mesmo exclusivamente sob o ponto de vista financeiro e de cash-flow , o que haveria a comparar seria a vantagem ou prejuízo para as Autarquias, que têm a atribuição e competência de prestar os serviços de abastecimento de água, recolha e tratamento de águas residuais e águas pluviais em "concessionar" (privatizar) ou prestar directamente o serviço.
Está provadíssimo e todos os dias são publicitados mais dados que o confirmam, os contractos de concessão são ruinosos para o Municípios, financeiramente muito menos "eficientes" que a prestação directa de um serviço melhor, mais barato para os utentes e mais inclusivo.
Se compararmos os balanços financeiros das despesas e receitas com abastecimento de água, águas residuais e águas pluviais das Autarquias que privatizam com os daquelas que não privatizam, torna-se evidente que há enorme diferença, a favor do serviço público. E aí está o relatório do Tribunal de Contas a documentá-lo. Haveria que somar ainda a diferença de colecta aos utentes, pelos tarifários mais altos e custos de outros serviços (ramais, religações, esvaziamentos de fossas sépticas, etc); e considerar ainda, a celeridade nos cortes de água e os custos enormes de religação.
Fazendo as contas "sérias", a conclusão é completamente inversa do que pretende convencer-nos, fraudulentamente, o cartel dos concessionários privados.
Mas a água é um direito de todos, não o negócio de alguns.
Todas as "vantagens" da privatização da água alegadas pelo cartel dos concessionários privados são como "negócio", como "exploração de mercadoria".
O que satisfaz os utentes da água é um serviço universal, de qualidade, a satisfação do direito universal à água e ao saneamento. O mais barato possível, idealmente gratuito. Controlado democraticamente pelos utentes, transparente e universal.
Um serviço público é o contrário de um negócio.
A transformação do serviço público prestado pela Autarquia em negócio, pela empresarialização, passagem ao direito privado ou concessão a privados, não só demite a Autarquia de uma responsabilidade que é fundamental, como muda o objectivo:
– o objectivo do serviço público é a optimização da qualidade da prestação, da universalidade e equidade de satisfação de um direito fundamental , da acessibilidade económica do abastecimento de água e saneamento, que é um direito fundamental de todas as pessoas e faz parte do direito à vida. Uma prestação idealmente gratuita e, que, no mínimo, tem de ser garantida a toda e qualquer pessoa, em quantidade e qualidade adequada, mesmo que não possa pagar sem se privar de outros direitos fundamentais e constitucionais – à vida, à habitação, à saúde, à educação, a uma alimentação saudável, ao ambiente...
– o objectivo da empresa de direito privado é o lucro e foca a gestão nos dinheiros, a optimização do balancete financeiro e na facturação aos utentes, ao qual subordina a qualidade e universalidade da distribuição de água e saneamento de águas residuais. É a negação do direito fundamental à água e ao saneamento, o alijamento da obrigação autárquica de garantir esse direito, a negação de todo e qualquer o direito – só existe troca comercial quando é vantajosa para o fornecedor, com preços impostos e sem alternativa.
Os critérios de "eficiência" e "eficácia" da AEPSA referem-se todos ao negócio e ao cash-flow do prestador.
Quanto mais "eficiente", nesse sentido é a entidade prestadora, mais se afasta de um serviço público e mais se transforma num perverso negócio de extorsão, iniquidade, agravamento das desigualdades económicas e privação de direitos fundamentais.
A "Autoridade" para instituir o "dogma"
A doutrina pregada é, exclusiva e cruamente, um ideário capitalista puro e duro.
Claro que é uma "ideologia", mas uma ideologia que não dá jeito nenhum discutir em público, nem que alguém oiça contrapor-lhe argumentos.
Ou, talvez mais em rigor, uma "anti-ideologia": a negação ao adversário da faculdade de pensar, da filosofia, do pensamento político, da crítica e da contradição.
Faz parte da propaganda apresentar a sua doutrina como "solução única", ideologicamente neutra, produto "científico" de "cérebros superiores". Uma religião "única" e verdadeira.
Fogem como o diabo da cruz a todo o debate político, filosófico, social ou ideológico, que põe a nu os seus intentos e prejudica nas eleições os candidatos ao seu serviço.
Por isso é recorrente e atravessa toda a pregação doutrinária a repetição da "isenção ideológica" e "verdade científica" do que afirmam.
Pretendem impor a doutrina pela AUTORIDADE de ENTES SUPERIORES "sem ideologia", nem "política", nem "interesses", cuja sabedoria não é acessível aos cidadãos eleitores a quem só resta a FÉ nos DOGMAS estabelecidos pelos tais ENTES SUPERIORES.
E para pregar a doutrina precisam de um PROFETA em contacto e conhecimento privilegiado das mensagens dos entes superiores.
O melhor que conseguiram arranjar foi um funcionário do IST, fazendo entender que, por essa posição, estava imbuído da "sabedoria acumulada" dessa instituição e fazendo-o passar pela voz do IST que, de forma alguma, está autorizado a representar. Então, a autoridade de "ente superior" é atribuída ao IST, do qual o dito cujo funcionário se apresenta como Profeta.
Para escudar essa autoridade, alardeiam imprensa e televisões que o discurso do Profeta reproduz "tábuas da lei" corporizadas num "estudo do Instituto Superior Técnico".
Na cerimónia de apresentação dos "resultados do estudo", está presente o secretário de Estado do Ambiente, Carlos Martins; o jornal O Público menciona também o presidente da ERSAR, Jaime Melo Baptista e contacta, a propósito, o ministro do Ambiente. Nenhum deles admite ter lido o "estudo", mas prestam-se a dar-lhe credibilidade e a reforçar a imagem de "isenção" pretendida pelo cartel dos negócios da água.
Grande cobertura de imprensa e essas figuras públicas compõem assim a "imagem" de "Autoridade" à mensagem do Profeta.
Apoio de jornais e televisões que sabemos a quem pertencem e que têm a função de pregar a doutrina do capital? [23]
Apoio do Governo PS, que, tal como o PSD e o CDS, tem sido fidelíssimo servidor do cartel de negócios da água? [24]
Apoio do PS, na sua própria campanha eleitoral?
Apoio de Jaime Melo Baptista, que preserva invicto através de Governos PS e PSD-CDS o muito bem remunerado e poderoso cargo de presidente da ERSAR, entidade com um conselho de administração corporativo onde têm assento as empresas privadas, que tem instrumentalizado o ataque às competências autárquicas e a imposição de subidas tarifárias [25] , que é censurada pelo próprio Tribunal de Contas por incumprimento das recomendações de protecção do interesse público? [26]
Quem é enganado por esses "dogmas"?
E quem não reconhece essa doutrina?
5. O alegado "estudo"
O documento escondido
Não foi fácil obter o alegado "estudo": a distribuição foi muito estrita e muito seleccionados os contemplados; obtendo-se um desses poucos exemplares, foi preciso cortar a encadernação para conseguir fazer uma cópia digitalizada e só se consegue ler – com esforço – depois de impresso.
Tamanho A4, 100 páginas mais preâmbulo e capas; texto em cinzentinho claro, títulos em azul e várias páginas a cores, umas só para "enfeitar" e outras com quadros e gráficos.
Gastei uns euros vários para imprimir a preto e branco ... consultando depois a digitalização a cores em casos de dúvida.
É óbvio que a edição foi feita para "encher o olho", mas para não ser lida nem para ser reproduzida.
Foi distribuído em conjunto com três páginas intituladas "sumário executivo", de discurso doutrinário com as "mensagens" que a AEPSA pretende passar.
Assinala-se que não há qualquer referência ao IST nesse sumário.
O "estudo" cinge-se a uma escolha "conveniente" de apontamentos e extractos salteados e pontuais, nem sempre fiéis, de:
Daí, sempre omitindo o sujeito, desenvolvem as vantagens para o cartel dos concessionários, ou seja, que é um negócio muito rentável com lucros sempre garantidos muito superiores aos custos.
Mostram também que o serviço público arrecada menos lucros.
Logo, o negócio privado "é melhor".
Logo, concluem que a privatização é "boa".
Se é "boa" não pode ser "má". Logo, é falso que seja "má" ... e por aí afora.
Este raciocínio é um sofisma [22] , ou refutação sofística, uma técnica de argumentação de má fé para defender algo falso e confundir o contraditor.
A técnica do sofisma vem sendo estudada e utilizada há dois milénios e meio, sempre desenvolvida e apurada com requintes de circunvoluções e repetições para confundir a contra-argumentação.
O objectivo é induzir o contraditor menos treinado a contestar as qualidades atribuídas à privatização, ou seja, contestar os detalhes de que é "um excelente negócio"; e logo aí fica perdido, porque é incontestavelmente um negócio milionário.
O que tem de ser desmontado é o vício do raciocínio, escondendo o conflito de interesses e evidenciando as "qualidades" para um grupo de interesses, ou classe, como se fossem também "qualidades" para o grupo antagónico, que são, no caso presente, todas as outras classes.
Ou seja: "Sim, a privatização da água é um negócio muito rentável e "eficiente". Põe muito dinheiro nasua conta; e quanto melhor negócio e mais rendoso é para si, mais danoso para mim, porque é o meudinheiro que abastece a sua conta".
É uma fraude comparar o cash-flow do concessionário com o cash-flow da Autarquia que presta directamente os serviços.
Mesmo exclusivamente sob o ponto de vista financeiro e de cash-flow , o que haveria a comparar seria a vantagem ou prejuízo para as Autarquias, que têm a atribuição e competência de prestar os serviços de abastecimento de água, recolha e tratamento de águas residuais e águas pluviais em "concessionar" (privatizar) ou prestar directamente o serviço.
Está provadíssimo e todos os dias são publicitados mais dados que o confirmam, os contractos de concessão são ruinosos para o Municípios, financeiramente muito menos "eficientes" que a prestação directa de um serviço melhor, mais barato para os utentes e mais inclusivo.
Se compararmos os balanços financeiros das despesas e receitas com abastecimento de água, águas residuais e águas pluviais das Autarquias que privatizam com os daquelas que não privatizam, torna-se evidente que há enorme diferença, a favor do serviço público. E aí está o relatório do Tribunal de Contas a documentá-lo. Haveria que somar ainda a diferença de colecta aos utentes, pelos tarifários mais altos e custos de outros serviços (ramais, religações, esvaziamentos de fossas sépticas, etc); e considerar ainda, a celeridade nos cortes de água e os custos enormes de religação.
Fazendo as contas "sérias", a conclusão é completamente inversa do que pretende convencer-nos, fraudulentamente, o cartel dos concessionários privados.
Mas a água é um direito de todos, não o negócio de alguns.
Todas as "vantagens" da privatização da água alegadas pelo cartel dos concessionários privados são como "negócio", como "exploração de mercadoria".
O que satisfaz os utentes da água é um serviço universal, de qualidade, a satisfação do direito universal à água e ao saneamento. O mais barato possível, idealmente gratuito. Controlado democraticamente pelos utentes, transparente e universal.
Um serviço público é o contrário de um negócio.
A transformação do serviço público prestado pela Autarquia em negócio, pela empresarialização, passagem ao direito privado ou concessão a privados, não só demite a Autarquia de uma responsabilidade que é fundamental, como muda o objectivo:
– o objectivo do serviço público é a optimização da qualidade da prestação, da universalidade e equidade de satisfação de um direito fundamental , da acessibilidade económica do abastecimento de água e saneamento, que é um direito fundamental de todas as pessoas e faz parte do direito à vida. Uma prestação idealmente gratuita e, que, no mínimo, tem de ser garantida a toda e qualquer pessoa, em quantidade e qualidade adequada, mesmo que não possa pagar sem se privar de outros direitos fundamentais e constitucionais – à vida, à habitação, à saúde, à educação, a uma alimentação saudável, ao ambiente...
– o objectivo da empresa de direito privado é o lucro e foca a gestão nos dinheiros, a optimização do balancete financeiro e na facturação aos utentes, ao qual subordina a qualidade e universalidade da distribuição de água e saneamento de águas residuais. É a negação do direito fundamental à água e ao saneamento, o alijamento da obrigação autárquica de garantir esse direito, a negação de todo e qualquer o direito – só existe troca comercial quando é vantajosa para o fornecedor, com preços impostos e sem alternativa.
Os critérios de "eficiência" e "eficácia" da AEPSA referem-se todos ao negócio e ao cash-flow do prestador.
Quanto mais "eficiente", nesse sentido é a entidade prestadora, mais se afasta de um serviço público e mais se transforma num perverso negócio de extorsão, iniquidade, agravamento das desigualdades económicas e privação de direitos fundamentais.
A "Autoridade" para instituir o "dogma"
A doutrina pregada é, exclusiva e cruamente, um ideário capitalista puro e duro.
Claro que é uma "ideologia", mas uma ideologia que não dá jeito nenhum discutir em público, nem que alguém oiça contrapor-lhe argumentos.
Ou, talvez mais em rigor, uma "anti-ideologia": a negação ao adversário da faculdade de pensar, da filosofia, do pensamento político, da crítica e da contradição.
Faz parte da propaganda apresentar a sua doutrina como "solução única", ideologicamente neutra, produto "científico" de "cérebros superiores". Uma religião "única" e verdadeira.
Fogem como o diabo da cruz a todo o debate político, filosófico, social ou ideológico, que põe a nu os seus intentos e prejudica nas eleições os candidatos ao seu serviço.
Por isso é recorrente e atravessa toda a pregação doutrinária a repetição da "isenção ideológica" e "verdade científica" do que afirmam.
Pretendem impor a doutrina pela AUTORIDADE de ENTES SUPERIORES "sem ideologia", nem "política", nem "interesses", cuja sabedoria não é acessível aos cidadãos eleitores a quem só resta a FÉ nos DOGMAS estabelecidos pelos tais ENTES SUPERIORES.
E para pregar a doutrina precisam de um PROFETA em contacto e conhecimento privilegiado das mensagens dos entes superiores.
O melhor que conseguiram arranjar foi um funcionário do IST, fazendo entender que, por essa posição, estava imbuído da "sabedoria acumulada" dessa instituição e fazendo-o passar pela voz do IST que, de forma alguma, está autorizado a representar. Então, a autoridade de "ente superior" é atribuída ao IST, do qual o dito cujo funcionário se apresenta como Profeta.
Para escudar essa autoridade, alardeiam imprensa e televisões que o discurso do Profeta reproduz "tábuas da lei" corporizadas num "estudo do Instituto Superior Técnico".
Na cerimónia de apresentação dos "resultados do estudo", está presente o secretário de Estado do Ambiente, Carlos Martins; o jornal O Público menciona também o presidente da ERSAR, Jaime Melo Baptista e contacta, a propósito, o ministro do Ambiente. Nenhum deles admite ter lido o "estudo", mas prestam-se a dar-lhe credibilidade e a reforçar a imagem de "isenção" pretendida pelo cartel dos negócios da água.
Grande cobertura de imprensa e essas figuras públicas compõem assim a "imagem" de "Autoridade" à mensagem do Profeta.
Apoio de jornais e televisões que sabemos a quem pertencem e que têm a função de pregar a doutrina do capital? [23]
Apoio do Governo PS, que, tal como o PSD e o CDS, tem sido fidelíssimo servidor do cartel de negócios da água? [24]
Apoio do PS, na sua própria campanha eleitoral?
Apoio de Jaime Melo Baptista, que preserva invicto através de Governos PS e PSD-CDS o muito bem remunerado e poderoso cargo de presidente da ERSAR, entidade com um conselho de administração corporativo onde têm assento as empresas privadas, que tem instrumentalizado o ataque às competências autárquicas e a imposição de subidas tarifárias [25] , que é censurada pelo próprio Tribunal de Contas por incumprimento das recomendações de protecção do interesse público? [26]
Quem é enganado por esses "dogmas"?
E quem não reconhece essa doutrina?
5. O alegado "estudo"
O documento escondido
Não foi fácil obter o alegado "estudo": a distribuição foi muito estrita e muito seleccionados os contemplados; obtendo-se um desses poucos exemplares, foi preciso cortar a encadernação para conseguir fazer uma cópia digitalizada e só se consegue ler – com esforço – depois de impresso.
Tamanho A4, 100 páginas mais preâmbulo e capas; texto em cinzentinho claro, títulos em azul e várias páginas a cores, umas só para "enfeitar" e outras com quadros e gráficos.
Gastei uns euros vários para imprimir a preto e branco ... consultando depois a digitalização a cores em casos de dúvida.
É óbvio que a edição foi feita para "encher o olho", mas para não ser lida nem para ser reproduzida.
Foi distribuído em conjunto com três páginas intituladas "sumário executivo", de discurso doutrinário com as "mensagens" que a AEPSA pretende passar.
Assinala-se que não há qualquer referência ao IST nesse sumário.
O "estudo" cinge-se a uma escolha "conveniente" de apontamentos e extractos salteados e pontuais, nem sempre fiéis, de:
- Relatórios da ERSAR, essencialmente o RESARP 2016,
- Uma publicação sobre legislação autárquica e
- O PEAASAR 2020 (PEAASAR III);
Junta algumas manipulações de dados extraídos dessas fontes e comentários a gosto o todo vem profusamente "acondicionado" no discurso doutrinário já referido e nas invectivas contra quem diga outra coisa.
Não foi feito para ser publicado ou examinado – só era preciso ter "um livro fechado", que diz tal e tal coisa ... e para isso servia muito bem uma molhada de folhas qualquer.
Mesmo dando a cara nos eventos, sendo participantes activos e solidários na campanha do cartel da água, Jaime Melo Baptista e Carlos Martins tiveram todo o cuidado em recusar avalisar o "estudo", ou sequer emitir uma vaga opinião sobre ele, mesmo quando directamente inquiridos pelo jornal O Público ...
Ora, ora, porque seria?
A capa
Verdadeiramente original é a capa. Digna de menção e de ser conhecida.
Luís XIV, cognominado o "Rei Sol", disse: "L'état c'est Moi" (O Estado sou Eu). Rui Cunha Marques, caracterizado de "Espírito da Água", exibe: "O Instituto Superior Técnico sou Eu".
A capa tem um grafismo em tons de azul e verde que ocupa mais de metade da página; qualquer coisa com "ondas" que invoca o mar imenso, muito para além do assunto do trabalho, que é a água nos canos.
No canto superior esquerdo um pequenino símbolo do IST (ou parecido) com a inscrição TÉCNICO LISBOA; em baixo, em maiúsculas de corpo cerca de 5mm, o título: ANÁLISE DO DESEMPENHO DOS OPERADORES PRIVADOS E PÚBLICOS NO SECTOR DA ÁGUA EM PORTUGAL (negrito) e em seguida, também maiúsculas, no mesmo tipo de letra e tamanho, sem negrito, o nome do autor RUI CUNHA MARQUES.
Na contracapa, fundo azul, nome, nota biográfica de Rui Cunha Marques com foto em evidência, cristalizada numa gota e abaixo, itálico, a declaração da bondade e preço módico dos privados; no pé de página o mesmo símbolo invocando o IST.
Não foi feito para ser publicado ou examinado – só era preciso ter "um livro fechado", que diz tal e tal coisa ... e para isso servia muito bem uma molhada de folhas qualquer.
Mesmo dando a cara nos eventos, sendo participantes activos e solidários na campanha do cartel da água, Jaime Melo Baptista e Carlos Martins tiveram todo o cuidado em recusar avalisar o "estudo", ou sequer emitir uma vaga opinião sobre ele, mesmo quando directamente inquiridos pelo jornal O Público ...
Ora, ora, porque seria?
A capa
Verdadeiramente original é a capa. Digna de menção e de ser conhecida.
Luís XIV, cognominado o "Rei Sol", disse: "L'état c'est Moi" (O Estado sou Eu). Rui Cunha Marques, caracterizado de "Espírito da Água", exibe: "O Instituto Superior Técnico sou Eu".
A capa tem um grafismo em tons de azul e verde que ocupa mais de metade da página; qualquer coisa com "ondas" que invoca o mar imenso, muito para além do assunto do trabalho, que é a água nos canos.
No canto superior esquerdo um pequenino símbolo do IST (ou parecido) com a inscrição TÉCNICO LISBOA; em baixo, em maiúsculas de corpo cerca de 5mm, o título: ANÁLISE DO DESEMPENHO DOS OPERADORES PRIVADOS E PÚBLICOS NO SECTOR DA ÁGUA EM PORTUGAL (negrito) e em seguida, também maiúsculas, no mesmo tipo de letra e tamanho, sem negrito, o nome do autor RUI CUNHA MARQUES.
Na contracapa, fundo azul, nome, nota biográfica de Rui Cunha Marques com foto em evidência, cristalizada numa gota e abaixo, itálico, a declaração da bondade e preço módico dos privados; no pé de página o mesmo símbolo invocando o IST.
O capeamento prova o que já foi dito atrás sobre a autoria e exclusiva acreditação do texto ser o indivíduo contratado para o efeito.
Esse indivíduo usa o símbolo do IST como um emblema na lapela e sempre associado à sua pessoa – mas em lado nenhum, nem na capa nem no interior da publicação, aparece a designação oficial dessa entidade, nem qualquer menção que a responsabilize.
Por norma geral, na identificação de um "estudo" feito por encomenda aparece sempre em mais evidência na capa a entidade contratante, depois a entidade contratada, executora, e só depois, muitas vezes só no interior do documento, os indivíduos autores do trabalho, coordenadores e equipa técnica.
Neste caso, nem a AEPSA – que assume ter encomendado o estudo – nem o Instituto Superior Técnico – a quem as notícias o pretendem atribuir – assumem a "propriedade", a "autoria" nem qualquer responsabilidade ou credibilização do que aí vai escrito.
É óbvio que o objectivo é pôr na boca da instituição IST as declarações encomendadas pela AEPSA a Rui Cunha Marques, mas não se atrevem a falsificar formalmente a autoria.
E foi isso que transmitiram os jornais: "estudo do IST" diz tal e tal coisa.
Fraude que se desmente logo nas capas do documento propagandeado.
Os conteúdos gerais
O índice do "estudo" anuncia um Preâmbulo e cinco capítulos, designadamente:
1 - Introdução;
2 - Enquadramento Legal e Institucional;
3 - Setor da Água Em Portugal:
4 - Desempenho dos Setores Público e Privado
5- Conclusões e Notas
No fim, a Bibliografia.
Todo o texto é assertivo, argumentativo e doutrinário, primando por uma pobreza de fontes, de referências e de dados, referindo-se amiúde a si próprio como única "referência" de suporte às próprias afirmações e argumentos.
É um monólogo político oco e repetitivo, insistindo na "isenção" e "imparcialidade", para constantemente se repetir na evocação de uma argumentação vazia e estafada de elogio sem peias dos negócios privados da água e na adjectivação difamatória dos oponentes.
Baixo, presunçoso, descuidado, revelando profundo desconhecimento do sector, da história, dos dados, das engenharias pertinentes e das outras matérias técnicas, científicas, sociológicas, económicas e operacionais pertinentes à análise e diagnóstico do abastecimento de água e do saneamento – é um documento de péssima qualidade, profundamente desagradável.
Perdoem-me a adjectivação e o desabafo – mas tive de ler o documento de fio a pavio, uma tortura imposta pela justa causa ideológica de fazer o contraditório.
Deixo de lado o enviesamento, as distorções os erros, as doutrinas e argumentos do autor; analiso mais abaixo o capítulo quarto é, pressupostamente o "estudo" onde apresenta os alegados "indicadores de desempenho" e algumas outras "comparações numéricas" eventualmente susceptíveis de induzir em erro ou confusões.
Os capítulos primeiro e o quinto são exclusivamente argumentativos
Os capítulos segundo e terceiro apresentam descrições tendenciosas e orientadas para as conclusões; são essencialmente apontamentos salteados de um livro sobre legislação e do relatório anual do ERSAR, semeadas de "interpretações" e comentários.
O capítulo 3, intitulado "Setor água em Portugal" começa pelo título "Estrutura de Mercado" (cada um vê o que quer) e depois "números do sector", onde respiga uns poucos números e gráficos salteados que diz serem da ERSAR.
Como há muitas publicações da ERSAR, com vários volumes e anexos, e nunca é referenciada correctamente a fonte (título do documento, volume, data, página ou capítulo) ninguém consegue confirmar sequer a fonte e o enquadramento dos números e gráficos apresentados – não se pode confirmar coisa nenhuma.
Pesquisei no RASARP 2016 – a publicação mais recente com uma "descrição geral do sector" no volume 1 – encontrei um dos gráficos (com legenda diferente), mas nem rasto de alguns dos outros números ou gráficos; e desisti da pesquisa.
Algumas afirmações são incoerentes com dados mais robustos, por exemplo: "De acordo com o ERSAR 96% dos alojamentos em Portugal dispõe de serviço de abastecimento de água" e "desde 2011, não tem existido aumento significativo do abastecimento de água" (pag 34) ora o censo de 2011, inquirindo casa a casa, encontrou 99,5% da população residente com água no alojamento, da qual 87,9% abastecida por rede pública. De onde vem o valor de 96%, na mesma data, é um mistério insondável.
Apesar de várias referências a tarifários e muitíssimas a dinheiros, a única "amostra" tarifária que este estudo apresenta é no capítulo terceiro.
Apresenta parcialmente os tarifários da EPAL em Lisboa, (identificando-a erradamente como "Empresa Pública", que deixou de ser, desde que o DL 230/91 a transformou em Sociedade Anónima de direito privado) e em mais quatro concelhos: um com Serviços Municipalizados, outro Serviço Municipal, outro, concessão a uma empresa de capitais públicos (parceria Público-Público) e, finalmente, concessão a empresa privada.
Não faz um cálculo de facturas para diversos consumos, conforme é costume nestas comparações, só apresenta "parte" do regulamento tarifário.
Tudo muito bem escolhidinho, consegue uma aparência geral "parecida" entre as cinco e espera-se que as pessoas não se vão pôr a fazer contas de cabeça.
Fazendo as contas, vê-se que a "tarifa fixa" muito mais alta da empresa privada (mais de dupla dos serviços municipais, para água e esgoto) tem um peso muito grande no global da factura e sobrecarrega desproporcionadamete os pequenos consumos, anulando a vantagem do escalonamento.
Descarregando do site da ERSAR os regulamentos tarifários, verifica-se por exemplo, que, na empresa privada, as parcelas fixas de água e esgoto – que são muito altas – duplicam se o calibre do contador for superior a 20mm; enquanto que todas as outras têm uma tarifa fixa sempre igual para o esgoto e a tarifa fixa da água é a mínima para contadores de calibre até 25 mm, um valor normal para uma habitação "média-alta".
A Câmara e os SMAS sobem muito significativamente o preço da tarifa variável por m3 no escalão mais alto, acima dos 25m3/ mês ou seja, uma capitação superior a 200 l/dia para quatro pessoas, o que é bastante alto – num incentivo a uma moderação "razoável" da utilização da água. A empresa privada tem preços claramente inferiores às restantes para esse escalão consumos, o que poderia parecer "económico" para os utentes que usam muita água. Mas, para esses níveis de consumo, que geralmente é concentrado em determinadas horas, terão certamente um contador de água com calibre de, pelo menos, 25mm ... e lá se vai a economia.
Não vou daqui tirar conclusões – é absurdo tirar conclusões de uma pequeníssima amostragem – nem "puxar brasas à minha sardinha" justificando ou denegrindo qualquer das entidades referidas.
Só quero exemplificar a má fé deste alegado estudo, que vai "picar" casos escolhidos e deles apresenta informação incompleta e distorcida para enganar o leitor.
Comparações de tarifários são importantes, mas têm de se fazer com o cálculo da factura completa, para vários níveis de utilização e correspondendo a capitações razoáveis. Há dados fiáveis e públicos, é muito trabalhoso, mas correcto e exequível. E, para tirar conclusões têm de se tratar os dados do universo ou, pelo menos, de uma amostragem muito significativa.
A DECO fez isso para o artigo e infogramas que já referimos acima: foi buscar os tarifários todos ou quase todos, tratou-os, apresentou resultados para determinado intervalo de consumo. Podendo-se criticar o método, identificar imprecisões ou incorrecções no cálculo ou discordar das conclusões, é de respeitar, é um trabalho sério e informativo, pode ser referenciado e citado.
Ao contrário deste "estudo".
E poupo, a mim e a quem me leia, aos outros numerosíssimos exemplos semelhantes, generosamente distribuídos em toda a extensão do documento.
Os dados base e os números derivados
O estudo apresenta muitos "números" e "percentagens" sobre os quais discorre o autor e nos quais diz fundamentar as suas conclusões.
Esses números e percentagens não são mensuráveis, são derivações e combinações de outros números, que seriam os dados-base, medidos ou observados por alguém, em determinadas condições.
Sem alguma espécie de garantia sobre o rigor dos dados-base (de onde é que vem esse número? como foi obtido?) não há qualquer credibilidade no que é construído em cima deles.
Ora aqui começa a trapalhice, porque se perdeu o rasto dos dados-base e ao autor pouco importa se os números que "apanha", por um e por outro lado, têm fundamento em observações fidedignas ou são meras estimativas ou invenções de alguém, algures, para determinado fim – por exemplo, para o preenchimento de uma ficha burocrática e obrigatória qualquer.
O autor não fez nenhuma recolha de dados-base por observação directa, nem utiliza dados-base directamente obtidos por uma entidade especializada e credível, nem faz qualquer menção sobre as fontes de onde provém os dados-base que estão por trás dos números derivados que mostra. Usa e abusa de "valores derivados" apresentados por outrem, sem qualquer crítica ou critério, excepto convirem ou não às suas conclusões.
Não tem dados-base e as únicas fontes que indica para os dados derivados são:
Esse indivíduo usa o símbolo do IST como um emblema na lapela e sempre associado à sua pessoa – mas em lado nenhum, nem na capa nem no interior da publicação, aparece a designação oficial dessa entidade, nem qualquer menção que a responsabilize.
Por norma geral, na identificação de um "estudo" feito por encomenda aparece sempre em mais evidência na capa a entidade contratante, depois a entidade contratada, executora, e só depois, muitas vezes só no interior do documento, os indivíduos autores do trabalho, coordenadores e equipa técnica.
Neste caso, nem a AEPSA – que assume ter encomendado o estudo – nem o Instituto Superior Técnico – a quem as notícias o pretendem atribuir – assumem a "propriedade", a "autoria" nem qualquer responsabilidade ou credibilização do que aí vai escrito.
É óbvio que o objectivo é pôr na boca da instituição IST as declarações encomendadas pela AEPSA a Rui Cunha Marques, mas não se atrevem a falsificar formalmente a autoria.
E foi isso que transmitiram os jornais: "estudo do IST" diz tal e tal coisa.
Fraude que se desmente logo nas capas do documento propagandeado.
Os conteúdos gerais
O índice do "estudo" anuncia um Preâmbulo e cinco capítulos, designadamente:
1 - Introdução;
2 - Enquadramento Legal e Institucional;
3 - Setor da Água Em Portugal:
4 - Desempenho dos Setores Público e Privado
5- Conclusões e Notas
No fim, a Bibliografia.
Todo o texto é assertivo, argumentativo e doutrinário, primando por uma pobreza de fontes, de referências e de dados, referindo-se amiúde a si próprio como única "referência" de suporte às próprias afirmações e argumentos.
É um monólogo político oco e repetitivo, insistindo na "isenção" e "imparcialidade", para constantemente se repetir na evocação de uma argumentação vazia e estafada de elogio sem peias dos negócios privados da água e na adjectivação difamatória dos oponentes.
Baixo, presunçoso, descuidado, revelando profundo desconhecimento do sector, da história, dos dados, das engenharias pertinentes e das outras matérias técnicas, científicas, sociológicas, económicas e operacionais pertinentes à análise e diagnóstico do abastecimento de água e do saneamento – é um documento de péssima qualidade, profundamente desagradável.
Perdoem-me a adjectivação e o desabafo – mas tive de ler o documento de fio a pavio, uma tortura imposta pela justa causa ideológica de fazer o contraditório.
Deixo de lado o enviesamento, as distorções os erros, as doutrinas e argumentos do autor; analiso mais abaixo o capítulo quarto é, pressupostamente o "estudo" onde apresenta os alegados "indicadores de desempenho" e algumas outras "comparações numéricas" eventualmente susceptíveis de induzir em erro ou confusões.
Os capítulos primeiro e o quinto são exclusivamente argumentativos
Os capítulos segundo e terceiro apresentam descrições tendenciosas e orientadas para as conclusões; são essencialmente apontamentos salteados de um livro sobre legislação e do relatório anual do ERSAR, semeadas de "interpretações" e comentários.
O capítulo 3, intitulado "Setor água em Portugal" começa pelo título "Estrutura de Mercado" (cada um vê o que quer) e depois "números do sector", onde respiga uns poucos números e gráficos salteados que diz serem da ERSAR.
Como há muitas publicações da ERSAR, com vários volumes e anexos, e nunca é referenciada correctamente a fonte (título do documento, volume, data, página ou capítulo) ninguém consegue confirmar sequer a fonte e o enquadramento dos números e gráficos apresentados – não se pode confirmar coisa nenhuma.
Pesquisei no RASARP 2016 – a publicação mais recente com uma "descrição geral do sector" no volume 1 – encontrei um dos gráficos (com legenda diferente), mas nem rasto de alguns dos outros números ou gráficos; e desisti da pesquisa.
Algumas afirmações são incoerentes com dados mais robustos, por exemplo: "De acordo com o ERSAR 96% dos alojamentos em Portugal dispõe de serviço de abastecimento de água" e "desde 2011, não tem existido aumento significativo do abastecimento de água" (pag 34) ora o censo de 2011, inquirindo casa a casa, encontrou 99,5% da população residente com água no alojamento, da qual 87,9% abastecida por rede pública. De onde vem o valor de 96%, na mesma data, é um mistério insondável.
Apesar de várias referências a tarifários e muitíssimas a dinheiros, a única "amostra" tarifária que este estudo apresenta é no capítulo terceiro.
Apresenta parcialmente os tarifários da EPAL em Lisboa, (identificando-a erradamente como "Empresa Pública", que deixou de ser, desde que o DL 230/91 a transformou em Sociedade Anónima de direito privado) e em mais quatro concelhos: um com Serviços Municipalizados, outro Serviço Municipal, outro, concessão a uma empresa de capitais públicos (parceria Público-Público) e, finalmente, concessão a empresa privada.
Não faz um cálculo de facturas para diversos consumos, conforme é costume nestas comparações, só apresenta "parte" do regulamento tarifário.
Tudo muito bem escolhidinho, consegue uma aparência geral "parecida" entre as cinco e espera-se que as pessoas não se vão pôr a fazer contas de cabeça.
Fazendo as contas, vê-se que a "tarifa fixa" muito mais alta da empresa privada (mais de dupla dos serviços municipais, para água e esgoto) tem um peso muito grande no global da factura e sobrecarrega desproporcionadamete os pequenos consumos, anulando a vantagem do escalonamento.
Descarregando do site da ERSAR os regulamentos tarifários, verifica-se por exemplo, que, na empresa privada, as parcelas fixas de água e esgoto – que são muito altas – duplicam se o calibre do contador for superior a 20mm; enquanto que todas as outras têm uma tarifa fixa sempre igual para o esgoto e a tarifa fixa da água é a mínima para contadores de calibre até 25 mm, um valor normal para uma habitação "média-alta".
A Câmara e os SMAS sobem muito significativamente o preço da tarifa variável por m3 no escalão mais alto, acima dos 25m3/ mês ou seja, uma capitação superior a 200 l/dia para quatro pessoas, o que é bastante alto – num incentivo a uma moderação "razoável" da utilização da água. A empresa privada tem preços claramente inferiores às restantes para esse escalão consumos, o que poderia parecer "económico" para os utentes que usam muita água. Mas, para esses níveis de consumo, que geralmente é concentrado em determinadas horas, terão certamente um contador de água com calibre de, pelo menos, 25mm ... e lá se vai a economia.
Não vou daqui tirar conclusões – é absurdo tirar conclusões de uma pequeníssima amostragem – nem "puxar brasas à minha sardinha" justificando ou denegrindo qualquer das entidades referidas.
Só quero exemplificar a má fé deste alegado estudo, que vai "picar" casos escolhidos e deles apresenta informação incompleta e distorcida para enganar o leitor.
Comparações de tarifários são importantes, mas têm de se fazer com o cálculo da factura completa, para vários níveis de utilização e correspondendo a capitações razoáveis. Há dados fiáveis e públicos, é muito trabalhoso, mas correcto e exequível. E, para tirar conclusões têm de se tratar os dados do universo ou, pelo menos, de uma amostragem muito significativa.
A DECO fez isso para o artigo e infogramas que já referimos acima: foi buscar os tarifários todos ou quase todos, tratou-os, apresentou resultados para determinado intervalo de consumo. Podendo-se criticar o método, identificar imprecisões ou incorrecções no cálculo ou discordar das conclusões, é de respeitar, é um trabalho sério e informativo, pode ser referenciado e citado.
Ao contrário deste "estudo".
E poupo, a mim e a quem me leia, aos outros numerosíssimos exemplos semelhantes, generosamente distribuídos em toda a extensão do documento.
Os dados base e os números derivados
O estudo apresenta muitos "números" e "percentagens" sobre os quais discorre o autor e nos quais diz fundamentar as suas conclusões.
Esses números e percentagens não são mensuráveis, são derivações e combinações de outros números, que seriam os dados-base, medidos ou observados por alguém, em determinadas condições.
Sem alguma espécie de garantia sobre o rigor dos dados-base (de onde é que vem esse número? como foi obtido?) não há qualquer credibilidade no que é construído em cima deles.
Ora aqui começa a trapalhice, porque se perdeu o rasto dos dados-base e ao autor pouco importa se os números que "apanha", por um e por outro lado, têm fundamento em observações fidedignas ou são meras estimativas ou invenções de alguém, algures, para determinado fim – por exemplo, para o preenchimento de uma ficha burocrática e obrigatória qualquer.
O autor não fez nenhuma recolha de dados-base por observação directa, nem utiliza dados-base directamente obtidos por uma entidade especializada e credível, nem faz qualquer menção sobre as fontes de onde provém os dados-base que estão por trás dos números derivados que mostra. Usa e abusa de "valores derivados" apresentados por outrem, sem qualquer crítica ou critério, excepto convirem ou não às suas conclusões.
Não tem dados-base e as únicas fontes que indica para os dados derivados são:
- O PENSAAR 2020 (PEAASAR III), que é um documento de política, essencialmente de projecção a prazo e não é, de forma alguma, um estudo técnico-científico nem uma fonte de dados fiável;
- Os RASARP – Relatórios Anuais dos Serviços de Águas e Resíduos em Portugal continental – da ERSAR (2004 a 2016) dos quais apenas usa "alguns extractos" escolhidos a dedo e não localizados.
Ora o PENSAAR 2020, como os PEAASAR que o antecederam, é um programa político, um diploma legal de acção proposta pelo Governo em política da água, não é nenhuma fonte oficial de dados científicos. Como não são fontes de dados-base os programas eleitorais, nem outros planos e programas – são fontes próprias para conhecer os compromissos e declaração de intenções de quem os fez, mais coisa nenhuma.
Se há estudos sérios "prévios" aos planos ou programas, não são publicados nos diplomas legais e seria preciso acedê-los, nos serviços de origem, para obter os dados de base.
As publicações da ERSAR, embora apresentadas como "documento branco", são também fortemente associadas a propagação doutrinária e contém pouquíssimos "dados de base"; a ERSAR não faz recolha sistemática de dados de campo; a informação de base que recebe é das várias entidades e, dessa, a única "autentica" são as análises de qualidade da água e os tarifários aprovados – que não publica nos RESAAP e só disponibiliza, uma a uma, as imagens dos documentos digitalizados.
Desses relatórios, Cunha Marques não usa nem a informação descriminada sobre qualidade da água, nem qualquer dado de base; faz extenso uso e abuso de "alguns" dos designados por "indicadores de desempenho". A filosofia e conceito desses "indicadores" acentuadamente orientada pela doutrina capitalista de mercado, como se exemplifica adiante, com o indicador "perdas de água"; são preenchidos pelas próprias entidades pressupostamente "avaliadas" e o próprio guia de aplicação admite, para muitos deles e nomeadamente para quase todos os que são usados neste "estudo", que sejam "estimados" pelos "avaliados".
Rui Cunha Marques, que só sabe responder ao contraditório declarando "ex catedra" que estão imbuídos de "preconceitos" por "ideologia" e "interesses políticos"; que desenvolve a teoria de que as Autarquias não podem ser competentes na prestação de serviços por serem órgãos políticos, usa, como fontes únicas e exclusivas de informação e credibilização, sem qualquer crítica nem comentário, os documentos políticos do Governo.
A falcatrua das "perdas de água" e os indicadores de desempenho da ERSAR
Convém aqui esclarecer um ponto que é "cavalo de batalha" dos privatizadores – a falcatrua das "perdas de água".
O que Cunha Marques e os apaniguados da doutrina que defende denominam "perdas de água" é adiferença entre o volume de água captada , ou mais frequentemente, o volume comprado ao concessionário do sistema multimunicipal e o volume de água facturado aos clientes .
Esta é a "conta" que importa aos negociantes.
Acontece que as Autarquias usam água. E muita.
Mais rigorosamente – os munícipes e visitantes usam muita água que não lhes é cobrada.
Se há estudos sérios "prévios" aos planos ou programas, não são publicados nos diplomas legais e seria preciso acedê-los, nos serviços de origem, para obter os dados de base.
As publicações da ERSAR, embora apresentadas como "documento branco", são também fortemente associadas a propagação doutrinária e contém pouquíssimos "dados de base"; a ERSAR não faz recolha sistemática de dados de campo; a informação de base que recebe é das várias entidades e, dessa, a única "autentica" são as análises de qualidade da água e os tarifários aprovados – que não publica nos RESAAP e só disponibiliza, uma a uma, as imagens dos documentos digitalizados.
Desses relatórios, Cunha Marques não usa nem a informação descriminada sobre qualidade da água, nem qualquer dado de base; faz extenso uso e abuso de "alguns" dos designados por "indicadores de desempenho". A filosofia e conceito desses "indicadores" acentuadamente orientada pela doutrina capitalista de mercado, como se exemplifica adiante, com o indicador "perdas de água"; são preenchidos pelas próprias entidades pressupostamente "avaliadas" e o próprio guia de aplicação admite, para muitos deles e nomeadamente para quase todos os que são usados neste "estudo", que sejam "estimados" pelos "avaliados".
Rui Cunha Marques, que só sabe responder ao contraditório declarando "ex catedra" que estão imbuídos de "preconceitos" por "ideologia" e "interesses políticos"; que desenvolve a teoria de que as Autarquias não podem ser competentes na prestação de serviços por serem órgãos políticos, usa, como fontes únicas e exclusivas de informação e credibilização, sem qualquer crítica nem comentário, os documentos políticos do Governo.
A falcatrua das "perdas de água" e os indicadores de desempenho da ERSAR
Convém aqui esclarecer um ponto que é "cavalo de batalha" dos privatizadores – a falcatrua das "perdas de água".
O que Cunha Marques e os apaniguados da doutrina que defende denominam "perdas de água" é adiferença entre o volume de água captada , ou mais frequentemente, o volume comprado ao concessionário do sistema multimunicipal e o volume de água facturado aos clientes .
Esta é a "conta" que importa aos negociantes.
Acontece que as Autarquias usam água. E muita.
Mais rigorosamente – os munícipes e visitantes usam muita água que não lhes é cobrada.
- Para fornecimento à Câmara e aos serviços autárquicos,
- Para chafarizes e fontanários públicos,
- Para balneários públicos, escolas, creches, pavilhões desportivos, bibliotecas da autarquia,
- Para lavagem de ruas, limpeza de edifícios públicos
- Para manutenção de jardins e espaços públicos
- Para instalações sanitárias públicas
- Para apoios a eventos e feiras municipais
Para uma enorme quantidade de serviços gratuitos que são disponibilizados aos munícipes e, naturalmente, precisam de água e saneamento.
As Câmaras não cobram a água a si próprias – umas medem, outras não medirão, o que não afecta os serviços prestados – mas, naturalmente, não cobram a si próprias, não tem qualquer sentido emitir facturas, porque essa água não é cobrada. As Câmaras e SMAS são entidades de direito público , têm por objectivo o serviço e a contabilidade é completamente diferente das entidades de direito privado.
Da mesma forma que não tem sentido um pequeno agricultor facturar as hortaliças, os ovos e os frutos que consome na sua própria casa – só factura o que vende formalmente no mercado – e a transacção comercial paga IVA e IRC. Claro que o auto-abastecimento não é perda nenhuma, pelo contrário, é uma optimização da produção. Mas é um "pecado capital", ou um "pecado de capital" na doutrina dos cartéis monopolistas do capital – é uma "perda" de negócio.
Os concessionários dos serviços privatizados não fornecem nada gratuitamente – cobram cada gota – então, as Autarquias pagam o uso próprio e todos os serviços gratuitos ou esses são cortados logo que o concessionário instala o negócio, como já aconteceu, por exemplo, com os fontanários em Tondela. Este tem sido mais um dos aspectos das privatizações ruinosos para as Autarquias.
Só com as cobranças às Autarquias, as privatizações por concessão originam muito mais facturação, naturalmente. Facturação ao serviço público e ao serviço gratuito!
Assim, todas as privatizações formais – passagem do direito público ao direito privado – se traduzem em muito mais facturação.
Nada haveria a criticar se nos mostrassem essa comparação com a designação correcta, nomeadamente "diferenças de facturação" entre serviços públicos e empresas de direito privado.
A trafulhice está em designarem essa conta por "perdas de água", notoriamente de má fé e para denegrir a qualidade do serviço público.
Nunca apresentam "as perdas e ganhos" de serviços, nomeadamente de serviços gratuitos ou quase gratuitos.
Nem contabilizam – para ver a quem as coisas são facturadas – as facturas pagas pela autarquia aos concessionários.
A trafulhice das "perdas de água" é apenas um dos exemplos da manipulação de má fé que preside à "avaliação" dos serviços pelos alegados indicadores de desempenho ou "benchmarking" (em inglês para parecer mais culto) apresentados nos relatórios da ERSAR e "recondicionados" e ainda mais manipulados na tese de Rui Costa Marques.
A BURKA NEGRA DOS INTERESSES DE CARTEL
Não cabe aqui a análise detalhada desses "pseudo-indicadores". Mas bom é de ver que esses, sim, são uma invenção tendenciosa e de má-fé para manipulação da opinião pública.
Que a ERSAR apresenta em vez dos dados de base tais quais, que não faz mesmo questão em averiguar.
Já muito longe da "nudez crua da realidade sob o manto diáfano da fantasia" – o que nos impingem é a "ocultação total da realidade sob a opaca burka negra dos interesses de cartel".
"Happy end": a Bibliografia ... e lá se vai o castelo de cartas!
A credibilidade de uma comunicação técnica ou científica é atestada, em grande parte, pelas fontes da informação apresentada e pelas referências bibliográficas.
É obrigatória a identificação rigorosa e unívoca das fontes e referências bibliográficas nos artigos e livros científicos e técnicos, nas teses e dissertações e para inclusão de rubricas na Wikipedia.
Em primeiro lugar, para que quem lê possa confirmar que a informação transmitida – um número, um facto – foi realmente observado, e como, que não é uma "invenção" do autor ou a extrapolação ilegítima de outra informação qualquer.
Complementarmente e não menos importante, a bibliografia indica aos leitores onde podem aprofundar e complementar a matéria exposta e obter corroboração e desenvolvimento da exposição do autor.
E finalmente, a bibliografia exibe a profundidade e abrangência do conhecimento do autor sobre o tema e cuidado que teve em se documentar.
Uma tese tão controversa como a apresentada por Cunha Marques, que afronta uma multidão de defensores da tese contrária, exigiria um fortíssimo apoio bibliográfico e informação muito robusta para ao menos "parecer" credível. Tanto mais que é público e notório ser uma defesa feita de encomenda e que o autor tem uma atitude ostensivamente tendenciosa.
Pois na bibliografia que apresenta constam 22 referências, das quais:
- 13 (60%) são documentos de sua própria autoria e a maioria nem tem nada a ver com águas;
- 1 é um documento de consulta "Regime Jurídico das empresas municipais"
- 5 são documentos de política do Governo e publicações da ERSAR, que indica como fontes dos dados e que já se referiram atrás.
- As restantes 3 publicações contradizem frontalmente as teses de Cunha Marques e são, nomeadamente:
As Câmaras não cobram a água a si próprias – umas medem, outras não medirão, o que não afecta os serviços prestados – mas, naturalmente, não cobram a si próprias, não tem qualquer sentido emitir facturas, porque essa água não é cobrada. As Câmaras e SMAS são entidades de direito público , têm por objectivo o serviço e a contabilidade é completamente diferente das entidades de direito privado.
Da mesma forma que não tem sentido um pequeno agricultor facturar as hortaliças, os ovos e os frutos que consome na sua própria casa – só factura o que vende formalmente no mercado – e a transacção comercial paga IVA e IRC. Claro que o auto-abastecimento não é perda nenhuma, pelo contrário, é uma optimização da produção. Mas é um "pecado capital", ou um "pecado de capital" na doutrina dos cartéis monopolistas do capital – é uma "perda" de negócio.
Os concessionários dos serviços privatizados não fornecem nada gratuitamente – cobram cada gota – então, as Autarquias pagam o uso próprio e todos os serviços gratuitos ou esses são cortados logo que o concessionário instala o negócio, como já aconteceu, por exemplo, com os fontanários em Tondela. Este tem sido mais um dos aspectos das privatizações ruinosos para as Autarquias.
Só com as cobranças às Autarquias, as privatizações por concessão originam muito mais facturação, naturalmente. Facturação ao serviço público e ao serviço gratuito!
Assim, todas as privatizações formais – passagem do direito público ao direito privado – se traduzem em muito mais facturação.
Nada haveria a criticar se nos mostrassem essa comparação com a designação correcta, nomeadamente "diferenças de facturação" entre serviços públicos e empresas de direito privado.
A trafulhice está em designarem essa conta por "perdas de água", notoriamente de má fé e para denegrir a qualidade do serviço público.
Nunca apresentam "as perdas e ganhos" de serviços, nomeadamente de serviços gratuitos ou quase gratuitos.
Nem contabilizam – para ver a quem as coisas são facturadas – as facturas pagas pela autarquia aos concessionários.
A trafulhice das "perdas de água" é apenas um dos exemplos da manipulação de má fé que preside à "avaliação" dos serviços pelos alegados indicadores de desempenho ou "benchmarking" (em inglês para parecer mais culto) apresentados nos relatórios da ERSAR e "recondicionados" e ainda mais manipulados na tese de Rui Costa Marques.
A BURKA NEGRA DOS INTERESSES DE CARTEL
Não cabe aqui a análise detalhada desses "pseudo-indicadores". Mas bom é de ver que esses, sim, são uma invenção tendenciosa e de má-fé para manipulação da opinião pública.
Que a ERSAR apresenta em vez dos dados de base tais quais, que não faz mesmo questão em averiguar.
Já muito longe da "nudez crua da realidade sob o manto diáfano da fantasia" – o que nos impingem é a "ocultação total da realidade sob a opaca burka negra dos interesses de cartel".
"Happy end": a Bibliografia ... e lá se vai o castelo de cartas!
A credibilidade de uma comunicação técnica ou científica é atestada, em grande parte, pelas fontes da informação apresentada e pelas referências bibliográficas.
É obrigatória a identificação rigorosa e unívoca das fontes e referências bibliográficas nos artigos e livros científicos e técnicos, nas teses e dissertações e para inclusão de rubricas na Wikipedia.
Em primeiro lugar, para que quem lê possa confirmar que a informação transmitida – um número, um facto – foi realmente observado, e como, que não é uma "invenção" do autor ou a extrapolação ilegítima de outra informação qualquer.
Complementarmente e não menos importante, a bibliografia indica aos leitores onde podem aprofundar e complementar a matéria exposta e obter corroboração e desenvolvimento da exposição do autor.
E finalmente, a bibliografia exibe a profundidade e abrangência do conhecimento do autor sobre o tema e cuidado que teve em se documentar.
Uma tese tão controversa como a apresentada por Cunha Marques, que afronta uma multidão de defensores da tese contrária, exigiria um fortíssimo apoio bibliográfico e informação muito robusta para ao menos "parecer" credível. Tanto mais que é público e notório ser uma defesa feita de encomenda e que o autor tem uma atitude ostensivamente tendenciosa.
Pois na bibliografia que apresenta constam 22 referências, das quais:
- 13 (60%) são documentos de sua própria autoria e a maioria nem tem nada a ver com águas;
- 1 é um documento de consulta "Regime Jurídico das empresas municipais"
- 5 são documentos de política do Governo e publicações da ERSAR, que indica como fontes dos dados e que já se referiram atrás.
- As restantes 3 publicações contradizem frontalmente as teses de Cunha Marques e são, nomeadamente:
- O Relatório nº 03/2014 – 2ª Secção, do Tribunal de Contas, "Regulação de PPP no Sector das Águas (sistemas em baixa)" , que já referimos acima, que documenta os prejuízos públicos das concessões dos serviços de águas a privados em Portugal.
- Mulreany, John P. et al - "Water privatization and public health in Latin America" [29] que conclui que não há nenhum benefício sanitário da privatização e que: "do ponto de vista da equidade e da justiça, a privatização (da água e saneamento) poderá fomentar uma visão minimalista da responsabilidade social em matéria sanitária que, por sua vez, poderá minar as fundações do sistema de saúde a longo prazo." (sic)
- Lobina, Emanuele – "Our Public Water Future The global experience with remunicipalisation" [30] , que é apenas uma pequena actualização da versão que está traduzida em português e disponível na internet com o título: "Veio para ficar – a tendência global de remunicipalização" [31]
Este último é a pérola da bibliografia, cuja leitura recomendo vivamente.
Foi traduzido para português com a colaboração da Campanha "Água de Todos" [32] e do STAL [33](Sindicato dos Trabalhadores da Administração Local /CGTP IN) e está disponível no portal da AIA de Setúbal (Associação Intermunicipal da Água da Região de Setúbal) [34] , entre outros locais.
Transcrevo a introdução:
Foi traduzido para português com a colaboração da Campanha "Água de Todos" [32] e do STAL [33](Sindicato dos Trabalhadores da Administração Local /CGTP IN) e está disponível no portal da AIA de Setúbal (Associação Intermunicipal da Água da Região de Setúbal) [34] , entre outros locais.
Transcrevo a introdução:
Cada vez mais cidades, regiões e países por todo o mundo estão a optar por fechar o livro das privatizações no sector da água e a remunicipalizar serviços, retomando o controlo público da gestão da água e do saneamento.
Em muitos casos, isto é uma resposta às falsas promessas dos operadores privados e ao seu fracasso em colocar o interesse das comunidades acima do lucro.
Este relatório vê a crescente onda de remunicipalizações nos serviços de abastecimento de água e saneamento como uma tendência global e apresenta a mais completa análise de casos até à data.
Nos últimos 15 anos houve pelo menos 180 casos de remunicipalização em 35 países, tanto do Norte como do Sul, incluindo casos de alto perfil na Europa, Américas, Ásia e África. Exemplo de grandes cidades que remunicipalizaram são Accra (Ghana), Berlim (Alemanha), Buenos Aires (Argentina), Budapest (Hungria), Kuala Lumpur (Malásia), La Paz (Bolívia), Maputo (Moçambique) e Paris (França). Por contraste, neste mesmo período, houve muito poucos casos de privatizações nas grandes cidades: são disso exemplo a cidade de Nagpur (Índia), que teve grande oposição e contestação e Jeddah (Arábia Saudita).
Apesar de mais de três décadas de incansável propaganda a favor das privatizações e das parcerias público-privado (PPP), por instituições financeiras internacionais e governos, parece agora que a remunicipalização é uma opção política que veio para ficar. A experiência directa com problemas comuns na gestão privada da água – desde a falta de investimento em infraestruturas, até ao aumento de tarifas e danos ambientais – persuadiu comunidades e políticos, que o sector público está melhor habilitado a prestar um serviço de qualidade aos cidadãos e a promover o direito humano à água.
A remunicipalização consiste na devolução dos serviços de água e saneamento anteriormente privatizados, ao poder local ou, mais genericamente, ao controlo público. Tipicamente, isto acontece após os contratos estabelecidos com as autarquias locais terminarem, ou através da sua não renovação, mas este processo não ocorre exclusivamente a nível local. As autoridades regionais e nacionais têm uma considerável influência sobre as políticas e financiamento de serviços, e, em alguns casos, actuam directamente como operadores nos serviços de água, portanto o processo desenvolve-se dentro de um contexto mais amplo.
Seja qual for a sua forma ou escala, a remunicipalização é geralmente uma reacção colectiva contra a insustentabilidade da privatização da água e das PPP.
Confrontadas com a impopularidade da privatização, as empresas privadas utilizam o marketing e a propaganda para levar as pessoas a acreditar que as concessões, contratos de arrendamento e outras PPP são muito diferentes de uma privatização; não são.
De facto, todos estes termos se traduzem na transferência do controlo dos serviços e da sua gestão para o sector privado. Os políticos têm de estar conscientes dos elevados custos e riscos inerentes à privatização da água, e como tal, têm muito a aprender com a experiência das autoridades públicas que optaram pela remunicipalização e estão a trabalhar para desenvolver uma gestão pública da água eficiente e democraticamente responsável.
Rui Cunha Marques não apresenta nenhuma referência bibliográfica coadjuvante da tese que defende. Nem uma!
O único "testemunho" que invoca para se credibilizar é ele mesmo – "vejam o que eu escrevi", "já publiquei muita coisa, sou bom".
Em contraponto, indica três publicações sérias e solidíssimas, apoiadas em informação comprovada e incontestável, que arrasam de alto a baixo o falacioso edifício doutrinário que pretendeu montar.
Pois é ...
Rui Cunha Marques encheu 97 páginas a montar um castelo de cartas e quando pôs as duas últimas, pimba! Escangalhou-se tudo.
E assim, esta fantasia hollywoodesca tem, como é da praxe e o público gosta, "um final feliz"
Ou, na língua preferida de Cunha Marques e do cartel da água: "HAPPY END!"
6. O conflito de interesses
Na posição oposta à da AEPSA, vinculada ao cartel dos negócios da água, está a Associação Água Pública, que, tal como a Campanha Água de Todos, em cuja Comissão Permanente se integra, defende os interesses dos utentes dos serviços de águas e a fruição universal dos direitos individuais e comuns à água.
Este grupo de interesses engloba as pessoas com interesse comum na fruição plena da água potável e adequado saneamento de águas residuais (e pluviais), bem como na minimização do que pagam por esses serviços e a maximização da fruição de outras prestações suportadas pelos orçamentos públicos autárquicos e centrais.
É contrária aos interesses dessa maioria a transferência de verbas públicas e de dinheiros dos seus próprios bolsos particulares, para financiamento de terceiros e, bem assim, é danoso que as rendas obtidas de bens, infraestruturas e capitais públicos paguem rendas privadas em vez de serem aplicadas em bens e serviços públicos e na redução dos impostos sobre rendimentos do trabalho, das reformas e das pensões.
Os interesses deste extensíssimo grupo, que abrange a quase totalidade da população residente em Portugal, são, pois, contrários aos do cartel representado pela AEPSA, cujos interesses são, exclusivamente e por definição, a transferência para as empresas do cartel de verbas públicas e de verbas particulares dos utentes dos serviços.
As posições opostas sobre a privatização da água são a expressão desse conflito de interesses.
Ninguém tem dúvidas que a privatização dos serviços de água é interesse primordial dos associados da AEPSA e há plena concordância em que as concessões desses serviços são negócios milionários para os empresários da água.
São esses interesses dos seus associados que a AEPSA defende; é em prol dos seus lucros empresariais e dos contractos leoninos que proporcionam transferências de elevadas verbas públicas para os bolsos do cartel, que a AEPSA entra em campanha.
Os interesses dos utentes da água são afirmados e defendidos por eles próprios nas suas próprias organizações, que, sem excepção, se opõem à privatização.
São defendidos pelos próprios utentes nos muitos abaixo-assinados e actos públicos que têm vindo a multiplicar-se em crescendo desde as primeiras privatizações e dos quais se realça, pela adesão e alcance, o Projecto de Lei de Iniciativa Legislativa de Cidadãos para "Proteção dos direitos individuais e comuns à Água"[35] , proposto por mais de 43 mil cidadãos eleitores.
Não se trata de "divergências de opinião", mas de um conflito irredutível de interesses, que opõe o cartel dos negócios da água à quase totalidade da população.
7. Interesses, política e privatização dos serviços autárquicos
Como se posiciona e actua cada partido político neste conflito de interesses, "de que lado está", é uma questão política de fundo e ideologicamente fracturante, a distinção mais básica entre política de direita e política de esquerda, entre capitalismo e socialismo.
Na Assembleia da República e no Governo, CDS, PSD e PS têm há muito actuado em prol dos interesses do cartel dos negócios da água; PCP, BE e PEV posicionam-se sempre em defesa dos interesses dos utentes . (ver historial no Comunicado da Associação Água Pública de 27 de Maio de 2011 [36] ; ver tramitação do Projecto de Lei de Protecção dos direitos individuais e comuns á água" na Assembleia da República [37]
Essas diferenças políticas estão presentes nas Autarquias. As políticas de abastecimento de água e saneamento das Câmaras não são todas iguais, bem pelo contrário. São particularmente notórias as diferenças em todo o histórico de níveis de atendimento em abastecimento de água e saneamento e também na qualidade de serviço, opções de gestão, prestações aos utentes, universalidade de acesso (incluindo acesso económico) e serviços gratuitos. Políticas totalmente diferentes no que diz respeito às concessões dos serviços de água, seja com privatização directa ou pelo "meio caminho" que é a empresarialização dos serviços.
Mas a fiscalização e controlo dos eleitores é muito mais efectiva em relação às Autarquias Locais que em relação aos órgãos centrais e essa fiscalização tem correspondência muito mais directa no sentido de voto; e as privatizações da água têm-se revelado ruinosas para as Câmaras.
Esses factores, e sobretudo a crescente contestação dos portugueses à privatização da água e a forte presença autárquica da CDU, têm impedido que a privatização dos serviços de abastecimento de água e saneamento autárquicos tenham seguido o ritmo das privatizações de outros sectores fundamentais apenas dependentes da Administração Central, como a energia, a banca, as comunicações, auto-estradas, portos, os aeroportos e os correios, por exemplo.
Todas as privatizações dos serviços autárquicos de águas e lixos foram feitas por executivos autárquicos dos partidos que, na Assembleia da República e no Governo, apoiam a privatização da água; mas muitíssimas Câmaras desses partidos não privatizaram e vários processos de privatização iniciados por esses executivos autárquicos abortaram devido à forte contestação dos munícipes.
No que diz respeito à distribuição e abastecimento de água domiciliário, desde 1994 até hoje, dos 308 municípios portugueses, 32 câmaras (10%) concessionaram o abastecimento de água a empresas totalmente privadas e mais 6 (2%) concessionaram a empresas de capital minoritariamente privado. Os restantes 87% dos concelhos têm serviços municipais, serviços municipalizados ou concessões a empresas de capitais exclusivamente públicos. A situação relativamente à drenagem de águas residuais é semelhante.
76% destas "privatizações totais" foram feitas durante os primeiros 10 anos e os restantes 24% nos 12 anos seguintes. Está em curso a primeira remunicipalização.
São excessivas privatizações na perspectiva dos interesses dos utentes e do interesse comum, e mais graves ainda porque há dois sistemas intermunicipais concessionados a privados (pela privatização da Aquapor, que pertencia às Águas de Portugal) e pelos sistemas multimunicipais concessionados a empresas de capitais públicos, dependentes maioritariamente da Administração Central, em que prevalece a óptica empresarial e é necessária pressão pública constante para impedir a sua privatização.
Mas não é, de todo, o panorama ambicionado pelo cartel associado na AEPSA.
Na sua campanha autárquica difama a prestação das Câmaras globalmente com duplo objectivo:
O único "testemunho" que invoca para se credibilizar é ele mesmo – "vejam o que eu escrevi", "já publiquei muita coisa, sou bom".
Em contraponto, indica três publicações sérias e solidíssimas, apoiadas em informação comprovada e incontestável, que arrasam de alto a baixo o falacioso edifício doutrinário que pretendeu montar.
Pois é ...
Rui Cunha Marques encheu 97 páginas a montar um castelo de cartas e quando pôs as duas últimas, pimba! Escangalhou-se tudo.
E assim, esta fantasia hollywoodesca tem, como é da praxe e o público gosta, "um final feliz"
Ou, na língua preferida de Cunha Marques e do cartel da água: "HAPPY END!"
6. O conflito de interesses
Na posição oposta à da AEPSA, vinculada ao cartel dos negócios da água, está a Associação Água Pública, que, tal como a Campanha Água de Todos, em cuja Comissão Permanente se integra, defende os interesses dos utentes dos serviços de águas e a fruição universal dos direitos individuais e comuns à água.
Este grupo de interesses engloba as pessoas com interesse comum na fruição plena da água potável e adequado saneamento de águas residuais (e pluviais), bem como na minimização do que pagam por esses serviços e a maximização da fruição de outras prestações suportadas pelos orçamentos públicos autárquicos e centrais.
É contrária aos interesses dessa maioria a transferência de verbas públicas e de dinheiros dos seus próprios bolsos particulares, para financiamento de terceiros e, bem assim, é danoso que as rendas obtidas de bens, infraestruturas e capitais públicos paguem rendas privadas em vez de serem aplicadas em bens e serviços públicos e na redução dos impostos sobre rendimentos do trabalho, das reformas e das pensões.
Os interesses deste extensíssimo grupo, que abrange a quase totalidade da população residente em Portugal, são, pois, contrários aos do cartel representado pela AEPSA, cujos interesses são, exclusivamente e por definição, a transferência para as empresas do cartel de verbas públicas e de verbas particulares dos utentes dos serviços.
As posições opostas sobre a privatização da água são a expressão desse conflito de interesses.
Ninguém tem dúvidas que a privatização dos serviços de água é interesse primordial dos associados da AEPSA e há plena concordância em que as concessões desses serviços são negócios milionários para os empresários da água.
São esses interesses dos seus associados que a AEPSA defende; é em prol dos seus lucros empresariais e dos contractos leoninos que proporcionam transferências de elevadas verbas públicas para os bolsos do cartel, que a AEPSA entra em campanha.
Os interesses dos utentes da água são afirmados e defendidos por eles próprios nas suas próprias organizações, que, sem excepção, se opõem à privatização.
São defendidos pelos próprios utentes nos muitos abaixo-assinados e actos públicos que têm vindo a multiplicar-se em crescendo desde as primeiras privatizações e dos quais se realça, pela adesão e alcance, o Projecto de Lei de Iniciativa Legislativa de Cidadãos para "Proteção dos direitos individuais e comuns à Água"[35] , proposto por mais de 43 mil cidadãos eleitores.
Não se trata de "divergências de opinião", mas de um conflito irredutível de interesses, que opõe o cartel dos negócios da água à quase totalidade da população.
7. Interesses, política e privatização dos serviços autárquicos
Como se posiciona e actua cada partido político neste conflito de interesses, "de que lado está", é uma questão política de fundo e ideologicamente fracturante, a distinção mais básica entre política de direita e política de esquerda, entre capitalismo e socialismo.
Na Assembleia da República e no Governo, CDS, PSD e PS têm há muito actuado em prol dos interesses do cartel dos negócios da água; PCP, BE e PEV posicionam-se sempre em defesa dos interesses dos utentes . (ver historial no Comunicado da Associação Água Pública de 27 de Maio de 2011 [36] ; ver tramitação do Projecto de Lei de Protecção dos direitos individuais e comuns á água" na Assembleia da República [37]
Essas diferenças políticas estão presentes nas Autarquias. As políticas de abastecimento de água e saneamento das Câmaras não são todas iguais, bem pelo contrário. São particularmente notórias as diferenças em todo o histórico de níveis de atendimento em abastecimento de água e saneamento e também na qualidade de serviço, opções de gestão, prestações aos utentes, universalidade de acesso (incluindo acesso económico) e serviços gratuitos. Políticas totalmente diferentes no que diz respeito às concessões dos serviços de água, seja com privatização directa ou pelo "meio caminho" que é a empresarialização dos serviços.
Mas a fiscalização e controlo dos eleitores é muito mais efectiva em relação às Autarquias Locais que em relação aos órgãos centrais e essa fiscalização tem correspondência muito mais directa no sentido de voto; e as privatizações da água têm-se revelado ruinosas para as Câmaras.
Esses factores, e sobretudo a crescente contestação dos portugueses à privatização da água e a forte presença autárquica da CDU, têm impedido que a privatização dos serviços de abastecimento de água e saneamento autárquicos tenham seguido o ritmo das privatizações de outros sectores fundamentais apenas dependentes da Administração Central, como a energia, a banca, as comunicações, auto-estradas, portos, os aeroportos e os correios, por exemplo.
Todas as privatizações dos serviços autárquicos de águas e lixos foram feitas por executivos autárquicos dos partidos que, na Assembleia da República e no Governo, apoiam a privatização da água; mas muitíssimas Câmaras desses partidos não privatizaram e vários processos de privatização iniciados por esses executivos autárquicos abortaram devido à forte contestação dos munícipes.
No que diz respeito à distribuição e abastecimento de água domiciliário, desde 1994 até hoje, dos 308 municípios portugueses, 32 câmaras (10%) concessionaram o abastecimento de água a empresas totalmente privadas e mais 6 (2%) concessionaram a empresas de capital minoritariamente privado. Os restantes 87% dos concelhos têm serviços municipais, serviços municipalizados ou concessões a empresas de capitais exclusivamente públicos. A situação relativamente à drenagem de águas residuais é semelhante.
76% destas "privatizações totais" foram feitas durante os primeiros 10 anos e os restantes 24% nos 12 anos seguintes. Está em curso a primeira remunicipalização.
São excessivas privatizações na perspectiva dos interesses dos utentes e do interesse comum, e mais graves ainda porque há dois sistemas intermunicipais concessionados a privados (pela privatização da Aquapor, que pertencia às Águas de Portugal) e pelos sistemas multimunicipais concessionados a empresas de capitais públicos, dependentes maioritariamente da Administração Central, em que prevalece a óptica empresarial e é necessária pressão pública constante para impedir a sua privatização.
Mas não é, de todo, o panorama ambicionado pelo cartel associado na AEPSA.
Na sua campanha autárquica difama a prestação das Câmaras globalmente com duplo objectivo:
- Por um lado, porque identifica globalmente o Poder Local Democrático como principal obstáculo à persecução dos seus interesses.
- Por outro lado, para obscurecer as enormes diferenças de políticas autárquicas e demover os eleitores do voto orientado para o melhor serviço público e melhor defesa dos interesses dos munícipes.
8. As Autarquias e o direito universal à água e ao saneamento
Os indicadores da universalidade do direito à água e ao saneamento são os níveis de atendimento em abastecimento de água e em recolha de águas residuais na residência habitual permanente.
Essa informação só é obtenível por inquérito casa a casa, na residência habitual de cada pessoa – o que só é feito nos recenseamentos gerais da população, uma vez em cada década.
São os censos, e só os censos, que fornecem esses dados [38] .
Tem sido elogiada – e bem – a cobertura da população portuguesa em abastecimento de água e drenagem de águas residuais.
De facto, o censo de 2011 regista 99,5% das residências permanentes com água domiciliária e 99,6% com saneamento de águas residuais. Não é o óptimo nem o "universal" e não considera as pessoas que nem sequer têm uma habitação digna, mas é muito significativo.
O que pretendo demonstrar é que o esforço brutal de transformação dos níveis de atendimento foi realizado no período em que o abastecimento de água foi exclusivamente público e de exclusiva competência autárquica: de 1974 a 1994.
Nem toda esta realização foi das Autarquias. Há, e houve desde 1976, executivos camarários muito diferentes, por isso votamos, para escolher entre as diferentes. E essas diferenças são muito acentuadas nos serviços de águas. Mas, onde as Câmaras não deram resposta, as pessoas, individualmente ou em pequenas associações, bem como numerosas Juntas de Freguesia, supriram deficiências com soluções locais e particulares.
O que é absolutamente falso é ter havido qualquer contributo das privatizações para esta enorme realização. O enorme salto qualitativo é entre 1974 e 1994 – ANTES da primeira privatização. Antes também dos sistemas multimunicipais.
Refiro-me aqui apenas à informação relativa a Portugal Continental, porque são os dados que tenho compilados e trabalhados, muitos deles durante a minha actividade profissional no INAG (Instituto da Água), que não tinha jurisdição sobre as Regiões Autónomas; e os dados do INAG são úteis para complementar os censos na reconstituição do historial dos níveis de atendimento por rede pública. E nas Regiões Autónomas não actuam concessionários privados, pelo que não relevam para a presente discussão.
Em 1972 o nível de atendimento por rede pública domiciliária era de 40%; 25% da população era abastecida por fontanário público. O acesso a redes de esgoto públicas era de 17%. [40]
Entre 1972 e 1994 o nível de atendimento em abastecimento de água domiciliário por rede pública passou de 40% para 81%. No mesmo período o nível de atendimento domiciliário por rede pública de esgotos passou de 17% para 60%.
O quadro seguinte, extraído de um documento do INAG [41] (2006) mostra a evolução entre 1981 e 2001, considerando os dados dos vários inquéritos de saneamento básico, a recolha feita no âmbito da extensa caracterização para os primeiros Planos de Bacia Hidrográfica consolidados para o primeiro Plano Nacional da Água [42] , e os censos (1981, 1991 e 2001).
Neste quadro só é feita distinção entre "sistema público" – ligado a rede pública – e "sistema particular", que são as soluções individuais e casos de condomínios ou muito pequenos agrupamentos com soluções autónomas (furos ou captações próprias; esgotos com fossas sépticas domésticas ou descargas desconhecidas).
Os níveis de atendimento (por definição) referem-se à percentagem da população residente servida.
Níveis de atendimento à População Residente no Continente [43] :
Os indicadores da universalidade do direito à água e ao saneamento são os níveis de atendimento em abastecimento de água e em recolha de águas residuais na residência habitual permanente.
Essa informação só é obtenível por inquérito casa a casa, na residência habitual de cada pessoa – o que só é feito nos recenseamentos gerais da população, uma vez em cada década.
São os censos, e só os censos, que fornecem esses dados [38] .
Tem sido elogiada – e bem – a cobertura da população portuguesa em abastecimento de água e drenagem de águas residuais.
De facto, o censo de 2011 regista 99,5% das residências permanentes com água domiciliária e 99,6% com saneamento de águas residuais. Não é o óptimo nem o "universal" e não considera as pessoas que nem sequer têm uma habitação digna, mas é muito significativo.
O que pretendo demonstrar é que o esforço brutal de transformação dos níveis de atendimento foi realizado no período em que o abastecimento de água foi exclusivamente público e de exclusiva competência autárquica: de 1974 a 1994.
Nem toda esta realização foi das Autarquias. Há, e houve desde 1976, executivos camarários muito diferentes, por isso votamos, para escolher entre as diferentes. E essas diferenças são muito acentuadas nos serviços de águas. Mas, onde as Câmaras não deram resposta, as pessoas, individualmente ou em pequenas associações, bem como numerosas Juntas de Freguesia, supriram deficiências com soluções locais e particulares.
O que é absolutamente falso é ter havido qualquer contributo das privatizações para esta enorme realização. O enorme salto qualitativo é entre 1974 e 1994 – ANTES da primeira privatização. Antes também dos sistemas multimunicipais.
Refiro-me aqui apenas à informação relativa a Portugal Continental, porque são os dados que tenho compilados e trabalhados, muitos deles durante a minha actividade profissional no INAG (Instituto da Água), que não tinha jurisdição sobre as Regiões Autónomas; e os dados do INAG são úteis para complementar os censos na reconstituição do historial dos níveis de atendimento por rede pública. E nas Regiões Autónomas não actuam concessionários privados, pelo que não relevam para a presente discussão.
Em 1972 o nível de atendimento por rede pública domiciliária era de 40%; 25% da população era abastecida por fontanário público. O acesso a redes de esgoto públicas era de 17%. [40]
Entre 1972 e 1994 o nível de atendimento em abastecimento de água domiciliário por rede pública passou de 40% para 81%. No mesmo período o nível de atendimento domiciliário por rede pública de esgotos passou de 17% para 60%.
O quadro seguinte, extraído de um documento do INAG [41] (2006) mostra a evolução entre 1981 e 2001, considerando os dados dos vários inquéritos de saneamento básico, a recolha feita no âmbito da extensa caracterização para os primeiros Planos de Bacia Hidrográfica consolidados para o primeiro Plano Nacional da Água [42] , e os censos (1981, 1991 e 2001).
Neste quadro só é feita distinção entre "sistema público" – ligado a rede pública – e "sistema particular", que são as soluções individuais e casos de condomínios ou muito pequenos agrupamentos com soluções autónomas (furos ou captações próprias; esgotos com fossas sépticas domésticas ou descargas desconhecidas).
Os níveis de atendimento (por definição) referem-se à percentagem da população residente servida.
Níveis de atendimento à População Residente no Continente [43] :
Abastecimento domiciliário por sistema público | 50% | 52,0% | 75% | 81% | 80,6% | 81,1% |
Abastecimento por poços e fontanários públicos | 17% | 17,0 % | 8,9% | 4,8% | 2,5% | 0,7% |
Abastecimento domiciliário por soluções particulares | 16% | 20.4% | 7% | 10,2% | 14,5% | 17,7% |
Total, abastecimento domiciliário | 66% | 72,4% | 82% | 90,2% | 93,8% | 98,8% |
População residente em zona infra-estruturada (ab. ag.) | 79,6% | 81,5% | ||||
Drenagem por sistema público | 38% | 60% | 60,3% | 64% | 64% | |
Drenagem por soluções particulares | 17% | 4% | 12,7% | 24,3% | 33% | |
Drenagem total | 49% | 55% | 64% | 73,9% | 87.1% | 97% |
Tratamento de águas residuais (sistema público) | 10% | 18.1% | 21.0% | 42,0% | 42% | |
Descarga de águas residuais em águas costeiras (sistema público) | 6,5% | 6,5% | 6,5% | 6,5% |
Note-se que os níveis de atendimento por rede pública de 2001, tanto em abastecimento de água como em drenagem de águas residuais, foram praticamente atingidos em 1994 – ANTES de qualquer privatização ou empresarialização .
Entre 1994 e 2001 há um aumento significativo do global da população que tem em casa água corrente e drenagem de águas residuais, mas esse aumento deve-se ao crescimento das soluções particulares . Há múltiplos factores e situações específicas que só seriam identificáveis se examinássemos os dados desagregados, com distribuição cartográfica e com a identificação de mobilidades, Mas, genericamente, o que aconteceu foi que, sendo as distribuições geográficas da população muito diversificadas e os executivos municipais não sendo todos iguais (e às vezes nem parecidos) havia zonas com níveis de atendimento muito baixos e a maioria das pessoas que não habitavam em zona infraestruturada, instalaram as suas soluções particulares.
Os dados de 2001 revelam que 98,8% da população residente no Continente tinha abastecimento de água domiciliário, dos quais 81,1% por rede pública. No censo de 2011 esses valores cresceram para 99,5% e 87,9 %, respectivamente.
O aumento do serviço por rede pública é de 6,8%, diminuindo 6,1% as soluções particulares, e o acréscimo global de "alojamentos servidos" foi de 0,7%.
Põem-se, no entanto, sérias dúvidas quanto ao significado real desta vultuosa transição de soluções particulares para rede pública.
Em 2009 foi publicado o DL 194/2009 [1] impondo a obrigação de ligação à rede pública, sob pena de uma coima que pode ir até 3 740 euros para pessoas singulares e até 44 890 euros para pessoas colectivas; e foram retiradas licenças de captação própria para abastecimento doméstico.
Por via deste decreto haverá muitos casos de transferência de soluções particulares para rede pública de pessoas e instituições que estavam servidas, obrigadas por coacção a ligar-se à rede pública ... vários, para se tornarem clientes forçados de concessionários da água. O Decreto Lei foi muito divulgado e foram falados e noticiados vários casos de protestos [44] .
Mas esta ameaça terá também induzido muitos recenseados com soluções particulares a declarar que estão ligados a rede pública, por receio da coima.
Assim, é fiável a percentagem global de 99,5% alojamentos com abastecimento de água, mas é incerta e muito duvidosa a diferenciação entre rede pública e soluções particulares,
A percentagem de alojamentos com drenagem de águas residuais sobe de 97%, em 2001, para 99,6% em 2011, um significativo aumento de 2,6%. Não existem dados fiáveis sobre o nível de atendimento em águas residuais por rede pública nem sobre a população residente servida com tratamento, após o primeiro Plano Nacional da Água, de 2002 [45] .
A enorme alteração de acesso à água e ao saneamento, da situação dramática de 1972 até ao que hoje chamam "milagre", deve-se primordialmente aos Serviços Públicos Autárquicos e, em segundo lugar, à melhoria geral das condições económicas da população e ao trabalho colectivo em muitas freguesias, que permitiu instalar soluções particulares de abastecimento de água e saneamento onde as Câmaras não as satisfizeram. Naturalmente e felizmente, continuou a melhorar o abastecimento de água e saneamento após 1994 – mas o grande impulso estava realizado e a dinâmica natural era de crescente melhoria.
É totalmente falso e abusivo atribuir qualquer mérito nesta evolução dos níveis de atendimento aos concessionários privados dos 12% das Câmaras que privatizaram os serviços depois de 1994 e que, nos raros casos em que aumentaram os níveis de atendimento por rede pública, foi à custa da ligação coerciva das soluções particulares e da apropriação das infraestruturas colectivas das freguesias.
A qualidade da água de abastecimento é também uma componente relevante no direito à água. Mas, também neste domínio, não podem os concessionários privados retirar quaisquer méritos nem fazer comparações.
Acontece que a enorme maioria dos sistemas de tratamento de águas para abastecimento, bem como os tratamentos de águas residuais, estão concessionados em sistemas multimunicipais a Sociedades Anónimas de capitais públicos. São esses concessionários que dispõem de estacões de tratamento (ETA e ETAR) e compete-lhes entregar a água tratada em condições, e bem assim, tratar o esgoto e devolvê-lo com qualidade própria à natureza. As câmaras concedentes mais não podem fazer que manter a desinfecção da água de abastecimento na rede de distribuição – e isso é feito, e bem, em todas as redes.
Ora, não podem os concessionários de sistemas "em baixa" ligados a sistemas multimunicipais vangloriar-se da qualidade da água servida. Não metem para aí prego nem estopa. Assim como os serviços públicos ligados aos multimunicipais nada podem fazer para melhorar a qualidade da água ou a qualidade do esgoto rejeitado.
Como a AEPSA não se mete com a AdP nem com os sistemas "em alta", as considerações sobre qualidade da água, de abastecimento ou de esgoto rejeitado, não têm qualquer cabimento no objecto do alegado "estudo".
9. Setembro, 24 a 29 – reforços estrangeiros para boicotar a campanha autárquica
Analisou-se a acção de abertura da pré-campanha autárquica do cartel dos negócios da água. É a primeira investida, "doméstica", só com recursos "nacionais".
Durante o mês de Setembro está anunciada uma série de eventos em crescendo, preparando e agregando participantes para a grande acção de campanha – " Porto Innovation Water Week ", de muito maior impacto mediático e com grandes recursos mobilizados do estrangeiro. [46]
Decorrerá no Porto de 24 a 29 de Setembro, os últimos dias de Campanha Autárquica.
Com apoio do Governo e participação de detentores de cargos públicos na Administração Central, contará com extensa intervenção de proeminentes missionários estrangeiros da privatização da água, em especial da privatização dos serviços de água: uns do lobby político na CE, outros com cargos sonantes no cartel dos negócios da água.
Culmina com a " Mayors & Water Conference 2017 " (Presidentes da Câmara e Água) programada para o dia 29 de Setembro, o dia de fecho da campanha autárquica, assegurando assim a ausência massiva (e silêncio) dos autarcas portugueses.
Para encher os jornais e televisões, no "dia de reflexão", de ataques às competências autárquicas e propaganda importada em prol da privatização e empresarialização dos serviços de água.
Os oradores convidados para discursar sobre a política autárquica da água [47] são o secretário de Estado de Ambiente, Carlos Martins e o presidente da ERSAR, Jaime Melo Baptista – já acima referidos pela "simpatia" com a propaganda corporativa da AEPSA; além desses, um candidato à Câmara do Porto, Filipe Araújo, que não destoará no discurso.
Os temas que irão estar em debate no referido evento, são elucidativos da campanha que têm vindo a ser desenvolvida contra a Água Pública e a gestão pública da água, desde logo o uso de sofismas como o uso e abuso da palavra "inovação", procurando esconder o objectivo de reivindicar, por parte dos grupos económicos da água, alterações à legislação europeia, sendo disso exemplo, o tema, "inovações para a implementação da legislação da UE em matéria de água". Com o mesmo propósito e intenção, usa-se a palavra "social" associada à "inovação" para eufemisticamente, se tratar da "governança orientada para o mercado", e ganhar a opinião pública para tal objectivo. Ou seja, para assegurar a privatização da água, sendo exemplo, o tema, "O envolvimento social, impulsionando a inovação e a governança: para uma abordagem orientada para o mercado".
E por ultimo, lá surge novamente a "inovação" associada aos centros de I&D e incubadoras para que, segundo eles, ajudem a resolver os problemas da água na Europa, não deixando por fim de forma descarada de anunciar o tema "O negócio da água", que é o fim último, desta semana de ofensiva contra a Água Pública, a decorrer na cidade do Porto, a que denominaram, " Porto Innovation Water Week ", ao apresentarem o tema, "O Negócio da Agua: mercados, oportunidades e emprego….", fingindo envolver os presidentes dos municípios que estão absorvidos com a campanha eleitoral para as eleições autárquicas de 1 de Outubro.
Á cabeça dos patrocinadores do evento [48] o "Sponser Gold" (patrocinador ouro) é a Veolia [49] (aliás CGE, aliás ex-Vivendi ). Na lista dos patrocinadores – os que pagam o evento – lá se seguem mais corporações do cartel.
O próprio Governo, como tal, aparece na lista dos apoiantes institucionais; a ERSAR aparece entre os patrocinadores; Águas de Portugal, LNEC e Câmara do Porto são "hospedeiros" da grande acção de campanha.
Toda a conferência é exclusivamente em inglês; a propaganda digerida em português é assegurada pela IMPRESA, com a SIC Notícias e o Expresso na primeira linha dos "Media Partners" [50] .
Temos por certo um ruído estrondoso nos "media" para abafar e se sobrepor â discussão política na Campanha Autárquica. A culminar no "dia de reflexão" e no próprio dia das eleições, com o excelente pretexto de o dia 1 de Outubro ser o Dia Nacional da Água.
Mas todo este estendal é uma mostra de "quem está ao lado de quem" e que interesses defende.
Olhando com olhos de ver, proporciona "uma separação das águas".
Bem necessária para reduzir os enganos quando se vai votar para a transmissão de poderes de decisão por um quadriénio.
10. Conclusões
O cartel das corporações de negócios privados da água entrou em força em campanha eleitoral autárquica sincronizada com o calendário eleitoral, investindo pesados recursos na manipulação fraudulenta da opinião pública, para influenciar o sentido de votação e abrir caminho a novas privatizações no próximo quadriénio.
Participam e financiam em força essa campanha as corporações monopolistas nacionais e estrangeiras, do cartel dos negócios da água e não só, sendo a propaganda feita pelos jornais, revistas e televisões a soldo do grande capital.
Pelos promotores e pelo discurso, é claramente identificável como acometida política, ideológica e doutrinária do capital monopolista transnacional, na sua luta pelo poder hegemónico contra a democracia conscientemente exercida pelos cidadãos.
O calendário evidencia que esse ataque político visa a manipulação da opinião dos eleitores e gerar ruído que esconda o debate político na campanha eleitoral, com o único objectivo de influenciar a seu favor os resultados das eleições autárquicas.
O enfoque desta retumbante inventiva mostra a centralidade política que atribuem à privatização dos serviços de água.
O discurso torna-se furioso no ataque à "ideologia", designada em geral, e às Autarquias eleitas. Identificandocomo principais adversários os eleitores pensantes e politicamente esclarecidos e o Poder Local Democrático.
O apoio ostensivo e explícito a esta campanha pelo Governo e por várias instituições dependentes da Administração Central, assim como da Câmara do Porto, mostram uma ponta do iceberg da intrusão dos cartéis monopolistas no poder político em Portugal.
PSD, CDS e PS servem há décadas, na Assembleia da República e no Governo, os interesses do cartel dos negócios da água. E esses partidos estão ao mesmo serviço em muitas autarquias, a par de vários autodenominados "independentes" que, como é próprio dos mercenários, fazem as guerras alheiasindependentemente de bandeira ou ideologia.
A actual composição da Assembleia da República e a dependência da conservação do Governo PS da aprovação à esquerda dos seus orçamentos e, nomeadamente a necessidade do PCP e do PEV para a manutenção desse estado de coisas, põe algumas baias ao PS na prestação de serviços ao imperialismo monopolista. Mas o PS não mudou, só se comporta um nadinha menos pior quando é obrigado; e aqui se apresenta, prestando vassalagem ao cartel dos negócios da água, ombro com ombro no ataque aos serviços públicos, às competências autárquicas e a boicotar o debate político indispensável a eleições democráticas e conscientes.
Esta acção, mais em força do que em jeito, do capital monopolista internacional e do cartel dos negócios da água, vindo a público em suas próprias identidades e nomes, ao invés de se esconderem, como é hábito, atrás de mercenários contratados para o efeito, traz à luz vários pontos de reflexão e debate fundamentais:
Evidencia a verdadeira e mais profunda divisão, não só nas eleições autárquicas, mas em todas as eleições e em toda a luta pelo poder político:
– ou nós, homens e mulheres todos, em democracia
– ou eles, através dos mercenários que ajudam a eleger, em oligarquia
Mostra os alinhamentos, que grupos políticos estão de um lado, quais estão do outro; e isso deveria facilitar muito as escolhas.
Põe em evidência a importância crucial do Poder Local na Democracia.
E finalmente, identifica a privatização da água como uma questão central de mobilização e luta da democracia contra a oligarquia.
E é uma questão central, porque provoca debate ideológico, claro e participado.
Nós outros, os que já tomámos há muito posição clara e irredutível neste confronto,
Nós outros, os que frontalmente e com alegria somos livres defendendo uma ideologia e içando a bandeira,
Nós outros, que somos o principal alvo desta investida sem que pronunciem o nosso nome,
Nós outros, olhando bem e mostrando a todos o que vemos,
Saberemos converter esta acometida do inimigo num ricochete contra ele próprio.
Entre 1994 e 2001 há um aumento significativo do global da população que tem em casa água corrente e drenagem de águas residuais, mas esse aumento deve-se ao crescimento das soluções particulares . Há múltiplos factores e situações específicas que só seriam identificáveis se examinássemos os dados desagregados, com distribuição cartográfica e com a identificação de mobilidades, Mas, genericamente, o que aconteceu foi que, sendo as distribuições geográficas da população muito diversificadas e os executivos municipais não sendo todos iguais (e às vezes nem parecidos) havia zonas com níveis de atendimento muito baixos e a maioria das pessoas que não habitavam em zona infraestruturada, instalaram as suas soluções particulares.
Os dados de 2001 revelam que 98,8% da população residente no Continente tinha abastecimento de água domiciliário, dos quais 81,1% por rede pública. No censo de 2011 esses valores cresceram para 99,5% e 87,9 %, respectivamente.
O aumento do serviço por rede pública é de 6,8%, diminuindo 6,1% as soluções particulares, e o acréscimo global de "alojamentos servidos" foi de 0,7%.
Põem-se, no entanto, sérias dúvidas quanto ao significado real desta vultuosa transição de soluções particulares para rede pública.
Em 2009 foi publicado o DL 194/2009 [1] impondo a obrigação de ligação à rede pública, sob pena de uma coima que pode ir até 3 740 euros para pessoas singulares e até 44 890 euros para pessoas colectivas; e foram retiradas licenças de captação própria para abastecimento doméstico.
Por via deste decreto haverá muitos casos de transferência de soluções particulares para rede pública de pessoas e instituições que estavam servidas, obrigadas por coacção a ligar-se à rede pública ... vários, para se tornarem clientes forçados de concessionários da água. O Decreto Lei foi muito divulgado e foram falados e noticiados vários casos de protestos [44] .
Mas esta ameaça terá também induzido muitos recenseados com soluções particulares a declarar que estão ligados a rede pública, por receio da coima.
Assim, é fiável a percentagem global de 99,5% alojamentos com abastecimento de água, mas é incerta e muito duvidosa a diferenciação entre rede pública e soluções particulares,
A percentagem de alojamentos com drenagem de águas residuais sobe de 97%, em 2001, para 99,6% em 2011, um significativo aumento de 2,6%. Não existem dados fiáveis sobre o nível de atendimento em águas residuais por rede pública nem sobre a população residente servida com tratamento, após o primeiro Plano Nacional da Água, de 2002 [45] .
A enorme alteração de acesso à água e ao saneamento, da situação dramática de 1972 até ao que hoje chamam "milagre", deve-se primordialmente aos Serviços Públicos Autárquicos e, em segundo lugar, à melhoria geral das condições económicas da população e ao trabalho colectivo em muitas freguesias, que permitiu instalar soluções particulares de abastecimento de água e saneamento onde as Câmaras não as satisfizeram. Naturalmente e felizmente, continuou a melhorar o abastecimento de água e saneamento após 1994 – mas o grande impulso estava realizado e a dinâmica natural era de crescente melhoria.
É totalmente falso e abusivo atribuir qualquer mérito nesta evolução dos níveis de atendimento aos concessionários privados dos 12% das Câmaras que privatizaram os serviços depois de 1994 e que, nos raros casos em que aumentaram os níveis de atendimento por rede pública, foi à custa da ligação coerciva das soluções particulares e da apropriação das infraestruturas colectivas das freguesias.
A qualidade da água de abastecimento é também uma componente relevante no direito à água. Mas, também neste domínio, não podem os concessionários privados retirar quaisquer méritos nem fazer comparações.
Acontece que a enorme maioria dos sistemas de tratamento de águas para abastecimento, bem como os tratamentos de águas residuais, estão concessionados em sistemas multimunicipais a Sociedades Anónimas de capitais públicos. São esses concessionários que dispõem de estacões de tratamento (ETA e ETAR) e compete-lhes entregar a água tratada em condições, e bem assim, tratar o esgoto e devolvê-lo com qualidade própria à natureza. As câmaras concedentes mais não podem fazer que manter a desinfecção da água de abastecimento na rede de distribuição – e isso é feito, e bem, em todas as redes.
Ora, não podem os concessionários de sistemas "em baixa" ligados a sistemas multimunicipais vangloriar-se da qualidade da água servida. Não metem para aí prego nem estopa. Assim como os serviços públicos ligados aos multimunicipais nada podem fazer para melhorar a qualidade da água ou a qualidade do esgoto rejeitado.
Como a AEPSA não se mete com a AdP nem com os sistemas "em alta", as considerações sobre qualidade da água, de abastecimento ou de esgoto rejeitado, não têm qualquer cabimento no objecto do alegado "estudo".
9. Setembro, 24 a 29 – reforços estrangeiros para boicotar a campanha autárquica
Analisou-se a acção de abertura da pré-campanha autárquica do cartel dos negócios da água. É a primeira investida, "doméstica", só com recursos "nacionais".
Durante o mês de Setembro está anunciada uma série de eventos em crescendo, preparando e agregando participantes para a grande acção de campanha – " Porto Innovation Water Week ", de muito maior impacto mediático e com grandes recursos mobilizados do estrangeiro. [46]
Decorrerá no Porto de 24 a 29 de Setembro, os últimos dias de Campanha Autárquica.
Com apoio do Governo e participação de detentores de cargos públicos na Administração Central, contará com extensa intervenção de proeminentes missionários estrangeiros da privatização da água, em especial da privatização dos serviços de água: uns do lobby político na CE, outros com cargos sonantes no cartel dos negócios da água.
Culmina com a " Mayors & Water Conference 2017 " (Presidentes da Câmara e Água) programada para o dia 29 de Setembro, o dia de fecho da campanha autárquica, assegurando assim a ausência massiva (e silêncio) dos autarcas portugueses.
Para encher os jornais e televisões, no "dia de reflexão", de ataques às competências autárquicas e propaganda importada em prol da privatização e empresarialização dos serviços de água.
Os oradores convidados para discursar sobre a política autárquica da água [47] são o secretário de Estado de Ambiente, Carlos Martins e o presidente da ERSAR, Jaime Melo Baptista – já acima referidos pela "simpatia" com a propaganda corporativa da AEPSA; além desses, um candidato à Câmara do Porto, Filipe Araújo, que não destoará no discurso.
Os temas que irão estar em debate no referido evento, são elucidativos da campanha que têm vindo a ser desenvolvida contra a Água Pública e a gestão pública da água, desde logo o uso de sofismas como o uso e abuso da palavra "inovação", procurando esconder o objectivo de reivindicar, por parte dos grupos económicos da água, alterações à legislação europeia, sendo disso exemplo, o tema, "inovações para a implementação da legislação da UE em matéria de água". Com o mesmo propósito e intenção, usa-se a palavra "social" associada à "inovação" para eufemisticamente, se tratar da "governança orientada para o mercado", e ganhar a opinião pública para tal objectivo. Ou seja, para assegurar a privatização da água, sendo exemplo, o tema, "O envolvimento social, impulsionando a inovação e a governança: para uma abordagem orientada para o mercado".
E por ultimo, lá surge novamente a "inovação" associada aos centros de I&D e incubadoras para que, segundo eles, ajudem a resolver os problemas da água na Europa, não deixando por fim de forma descarada de anunciar o tema "O negócio da água", que é o fim último, desta semana de ofensiva contra a Água Pública, a decorrer na cidade do Porto, a que denominaram, " Porto Innovation Water Week ", ao apresentarem o tema, "O Negócio da Agua: mercados, oportunidades e emprego….", fingindo envolver os presidentes dos municípios que estão absorvidos com a campanha eleitoral para as eleições autárquicas de 1 de Outubro.
Á cabeça dos patrocinadores do evento [48] o "Sponser Gold" (patrocinador ouro) é a Veolia [49] (aliás CGE, aliás ex-Vivendi ). Na lista dos patrocinadores – os que pagam o evento – lá se seguem mais corporações do cartel.
O próprio Governo, como tal, aparece na lista dos apoiantes institucionais; a ERSAR aparece entre os patrocinadores; Águas de Portugal, LNEC e Câmara do Porto são "hospedeiros" da grande acção de campanha.
Toda a conferência é exclusivamente em inglês; a propaganda digerida em português é assegurada pela IMPRESA, com a SIC Notícias e o Expresso na primeira linha dos "Media Partners" [50] .
Temos por certo um ruído estrondoso nos "media" para abafar e se sobrepor â discussão política na Campanha Autárquica. A culminar no "dia de reflexão" e no próprio dia das eleições, com o excelente pretexto de o dia 1 de Outubro ser o Dia Nacional da Água.
Mas todo este estendal é uma mostra de "quem está ao lado de quem" e que interesses defende.
Olhando com olhos de ver, proporciona "uma separação das águas".
Bem necessária para reduzir os enganos quando se vai votar para a transmissão de poderes de decisão por um quadriénio.
10. Conclusões
O cartel das corporações de negócios privados da água entrou em força em campanha eleitoral autárquica sincronizada com o calendário eleitoral, investindo pesados recursos na manipulação fraudulenta da opinião pública, para influenciar o sentido de votação e abrir caminho a novas privatizações no próximo quadriénio.
Participam e financiam em força essa campanha as corporações monopolistas nacionais e estrangeiras, do cartel dos negócios da água e não só, sendo a propaganda feita pelos jornais, revistas e televisões a soldo do grande capital.
Pelos promotores e pelo discurso, é claramente identificável como acometida política, ideológica e doutrinária do capital monopolista transnacional, na sua luta pelo poder hegemónico contra a democracia conscientemente exercida pelos cidadãos.
O calendário evidencia que esse ataque político visa a manipulação da opinião dos eleitores e gerar ruído que esconda o debate político na campanha eleitoral, com o único objectivo de influenciar a seu favor os resultados das eleições autárquicas.
O enfoque desta retumbante inventiva mostra a centralidade política que atribuem à privatização dos serviços de água.
O discurso torna-se furioso no ataque à "ideologia", designada em geral, e às Autarquias eleitas. Identificandocomo principais adversários os eleitores pensantes e politicamente esclarecidos e o Poder Local Democrático.
O apoio ostensivo e explícito a esta campanha pelo Governo e por várias instituições dependentes da Administração Central, assim como da Câmara do Porto, mostram uma ponta do iceberg da intrusão dos cartéis monopolistas no poder político em Portugal.
PSD, CDS e PS servem há décadas, na Assembleia da República e no Governo, os interesses do cartel dos negócios da água. E esses partidos estão ao mesmo serviço em muitas autarquias, a par de vários autodenominados "independentes" que, como é próprio dos mercenários, fazem as guerras alheiasindependentemente de bandeira ou ideologia.
A actual composição da Assembleia da República e a dependência da conservação do Governo PS da aprovação à esquerda dos seus orçamentos e, nomeadamente a necessidade do PCP e do PEV para a manutenção desse estado de coisas, põe algumas baias ao PS na prestação de serviços ao imperialismo monopolista. Mas o PS não mudou, só se comporta um nadinha menos pior quando é obrigado; e aqui se apresenta, prestando vassalagem ao cartel dos negócios da água, ombro com ombro no ataque aos serviços públicos, às competências autárquicas e a boicotar o debate político indispensável a eleições democráticas e conscientes.
Esta acção, mais em força do que em jeito, do capital monopolista internacional e do cartel dos negócios da água, vindo a público em suas próprias identidades e nomes, ao invés de se esconderem, como é hábito, atrás de mercenários contratados para o efeito, traz à luz vários pontos de reflexão e debate fundamentais:
Evidencia a verdadeira e mais profunda divisão, não só nas eleições autárquicas, mas em todas as eleições e em toda a luta pelo poder político:
– ou nós, homens e mulheres todos, em democracia
– ou eles, através dos mercenários que ajudam a eleger, em oligarquia
Mostra os alinhamentos, que grupos políticos estão de um lado, quais estão do outro; e isso deveria facilitar muito as escolhas.
Põe em evidência a importância crucial do Poder Local na Democracia.
E finalmente, identifica a privatização da água como uma questão central de mobilização e luta da democracia contra a oligarquia.
E é uma questão central, porque provoca debate ideológico, claro e participado.
Nós outros, os que já tomámos há muito posição clara e irredutível neste confronto,
Nós outros, os que frontalmente e com alegria somos livres defendendo uma ideologia e içando a bandeira,
Nós outros, que somos o principal alvo desta investida sem que pronunciem o nosso nome,
Nós outros, olhando bem e mostrando a todos o que vemos,
Saberemos converter esta acometida do inimigo num ricochete contra ele próprio.
23/Setembro/2017
11. Notas e Bibliografia
1. Porto water innovation week 2017 http://portowaterinnovationweek.eu/
https://web.archive.org/web/20170618103735/http://portowaterinnovationweek.eu/
Mayors and Water Conference 2017: URBAN WATER AGENDA (2030) 29 de setembro, web.archive.org/...
http://www.portowaterinnovationweek.eu/mayors-water/datebook
2. Tribunal de Contas, relatório de auditoria n.º 03/2014 – 2.ª Secção - Regulação de PPP no Sector das Águas (sistemas em baixa)www.tcontas.pt/pt/actos/rel_auditoria/2014/2s/audit-dgtc-rel003-2014-2s.shtm
e Tribunal de Contas, Relatório nº 2/2015 - 2ª Secção ., Auditoria de seguimento www.tcontas.pt/pt/actos/rel_auditoria/2015/2s/audit-dgtc-rel002-2015-2s.shtm
3. Pedro Ventura, "Privatização disfarçada sob o manto da concessão" , revista Poder Local, Julho de 2015. revistapoderlocal.pt/...
4. www.deco.proteste.pt/...
5. BEWG - Beijing Enterprises Water Group - que comprou em 2013 à Veolia/CGE, por 95 milhões de euros, o trespasse das concessões que essa multinacional detinha
6. Lançamento e apresentação da Iniciativa, em Outubro de 2011, resistir.info/agua/lei_prot_agua.html
7. Texto do Projecto de Lei e exposição de motivos; web.archive.org/...
Re-apresentação na AR em 2016 pelo PCP e pelo BE: app.parlamento.pt/... e app.parlamento.pt/...
8. Tramitação na Assembleia da República e votações:
app.parlamento.pt/...
app.parlamento.pt/...
app.parlamento.pt/...
notícias:
www.aguadetodos.com
www.aguadetodos.com/iniciativa-legislativa-de-cidadaos/ ;
www.aguadetodos.com/...
9. Ver notícia e documentos divulgados, à data, pela Associação Água Pública em: web.archive.org/...
10. United Nations General Assembly – Human Rights Council – " Report of the Special Rapporteur on the human rights to safe drinking water and sanitation on his mission to Portugal" [A/HRC/36/45/Add.1] Distr General: 10 July 2017 - Original: English
www.ecoi.net/file_upload/1930_1503494624_g1718647.pdf
11. Definição na Wikipedia: Corporate propaganda refers to propaganda disseminated by a corporation (or corporations), for the purpose of manipulating public opinion concerning to that corporation, and its activities. The use of corporate propaganda can be commonly found in the fields of advertising, marketing, politics, history, and public relations. There is debate as to whether corporate propaganda should be legal, with corporations claiming that advertising is an inherent right for any entity in a free market economy trying to sell a product or service, while modern leftists, social liberals and social rights activists argue that corporate propaganda is tantamount to brainwashing,https://en.wikipedia.org/wiki/Corporate_propaganda
12. Entre os estudos sérios e documentados sobre estas máquinas de propaganda, contam-se dois excelentes livros da autora australiana Sharon Beder, publicados em 2006 com os sugestivos títulos: "Suiting themselves – How Corporations Drive The Global Agenda" e "Free Market Missionairies – The corporate manipulation of comunity values"
13. Ver: Sharon Beder, 2004 "Moulding and Manipulating the News" - artigo completo em http://www.herinst.org/sbeder/#PR
14. O caso da privatização da energia, muito semelhante ao da água. é tratado por Sharon Beder em: Power Play – The Fight for control of the world electricity , 2003; tradução espanhola - Energía y poder: la lucha por el control de la electricidad en el mundo 2005; resenha, por José Alberto Delgado Barco, in Revista de Economía & Administración, vol. 3 no.1. enero - junio de 2006, www.google.pt/...
Ver também: www.uow.edu.au/~sharonb/about.html e http://www.herinst.org/sbeder/#PR
15. Ver página no portal do IST: fenix.tecnico.ulisboa.pt/homepage/ist24618 ;
16 ver página pessoal www.ruicunhamarques.com/ ; investigador (...), da Public Utility Research Center (PURC) na Universidade da Florida – ver página "Warrington College of Business" ( http://warrington.ufl.edu/centers/purc/ ); (Colégio de negócios)
e do Centro of Local Government (CLG) na Universidade de New England na Austrália, universidade onde é Professor Convidado da Business School ; (escola de negócios)
17. Ver: Rui Namorado Rosa, 2004, "Imperialismo: seus limites e alternativas": resistir.info/rui/rui_n_rosa_20set04.html
ver: V.I. Lenine, "O Imperialismo, fase superior do Capitalismo": www.editorial-avante.pcp.pt...
e Carlos Aboim Inglês, sobre "O Imperialismo, fase superior do Capitalismo": www.pcp.pt/publica/militant/247/p27.html
18. Ver
Rui Namorado Rosa, 2013 "A nova ordem mundial" www.odiario.info/a-nova-ordem-mundial/
Rui Namorado Rosa, 2016, "O bem estar das corporações multinacionais" https://www.odiario.info/o-bem-estar-das-corporacoes-multinacionais/
Rui Namorado Rosa, 2012, "Factores e Função de Produção Revisitados: Crítica e Alternativa ao Dogma Económico Oficial"
www.odiario.info/b2-img/FactoreseFunodeProduoRevisitadospaper_19052012.pdf
19. Ver; Rui Namorado Rosa, 2010, "On the performance of big companies in the crisis period 2005- 2010, in: "Perspectives in Econophysics II"em:
www.researchgate.net/... e slides em: www.researchgate.net/...
20. LPN e Fundação de Serralves: "CONVERSAS SOBRE O AMBIENTE 2012-2013" MESA REDONDA: PRIVATIZAÇÃO E CONCESSÃO DA ÁGUA, HÁ DIFERENÇA? PORTO, 16 DE MAIO DE 2013:
"A PRIVATIZAÇÃO DA ÁGUA POR CONCESSÃO" – Texto de apoio à intervenção de Luisa Tovar, em representação da Associação Água Pública, web.archive.org/...
"PRIVATIZAÇÃO E CONCESSÃO DA ÁGUA, HÁ DIFERENÇA?" Texto de apoio à intervenção de João Bau, web.archive.org/...
21. Luisa Tovar, "A Fronteira da Água", Revista Poder Local nº 141, Jul-Dez 2002, pag 12-26, revistapoderlocal.pt/...
22. Sofisma ou sofismo (do grego antigo, derivado de "fazer raciocínios capciosos") em filosofia, é um raciocínio [...], mediante os quais se quer defender algo falso e confundir o contraditor. Não devemos confundir os sofismas com os paralogismos: os primeiros procedem da má fé, os segundos, da ignorância. (wikipedia: pt.wikipedia.org/wiki/Sofisma )
23. Ver: Andrew Gavin Marshal, 2011, "Verdade, Propaganda e Manipulação dos Media" em www.odiario.info/verdade-propaganda-e-manipulacao-dos-media/
John Pilger, 2014, A guerra pelos media e o triunfo da propaganda
www.odiario.info/a-guerra-pelos-media-e-o-triunfo-da-propaganda/
24. Ver: Comunicado da Associação Água Pública de 27 de Maio de 2011, sobre o programa conjunto do PSD, PS e CDS para privatização da água, web.archive.org/...
Ver: "Iniciativa legislativa de cidadãos rejeitada no Parlamento", no portal "água de todos", www.aguadetodos.com/...
25. Ver: Nota de Imprensa da Associação Água Pública e do STAL, 18/3/2011 "A Factura da água" e comunicado da Associação Água Pública, Agosto de 2010, "O tarifário da ERSAR: subida brutal do tarifário da água e do saneamento" em web.archive.org/...
Ver: "Sobre as propostas de lei do Governo para favorecimento dos monopólios privados da água", Associação Água Pública, 27 de Março de 2013, Texto-base da intervenção inicial da Associação Água Pública na Audição pela Comissão de Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local da Assembleia da República, em 27/3/2013, sobre as propostas de Lei 123/XII e 125/XII, web.archive.org/...
Extracto: Sobre a Proposta de Lei 125/XII , estatutos da ERSAR:
Este novo estatuto torna a ERSAR uma entidade poderosíssima, nomeadamente na definição e imposição de tarifários de águas, esgotos e resíduos.
Tarifários esses que são englobados na factura da água e indexados à utilização da água e o corte de água garante a cobrança. É de facto uma taxa imposta, muito semelhante a um imposto e um imposto pela fruição de um direito fundamental que faz parte do direito à vida. Ora só os órgãos eleitos, a Assembleia da República e as Autarquias, têm competência para estabelecer impostos e taxas. O Governo, que não é eleito, não tem essa competência. Como pode uma entidade dependente do Governo, que nem sequer é da administração pública, ter competências que a Constituição Portuguesa reserva a órgãos eleitos?
Todos os dirigentes da ERSAR são nomeados pelo Governo e os Directores de entidades sob tutela do Governo preenchem uma parte muito significativa dos diversos conselhos.
É evidente, não só pela actuação anterior como por todo o articulado desta proposta de lei, que a função da ERSAR não tem qualquer relação com os sistemas físicos de águas esgotos ou lixos, com a qualidade técnica e sanitária das soluções nem com os níveis de atendimento, nem com qualquer outra melhoria no interesse dos cidadãos utilizadores da água (que são todos os seres humanos).
A ERSAR centra-se no circuito do dinheiro, não da água nem dos resíduos, visando o "bom funcionamento das empresas".
Bastos indicadores, entre eles a composição dos vários conselhos onde têm assento os empresários da água, mostram que o "bom funcionamento" tem a acepção de cumprimento do objectivo 2 e que a canalização de mais dinheiro dos utentes da água para as empresas do sector, através da subida da facturação, será uma das suas funções relevantes.
Aponto, em contraste com a importância atribuída à criação desta ERSAR, o descuro total com a regulamentação de segurança, concepção e projecto, com a ausência de observação e controlo, com a total desresponsabilização do dono da obra e do projectista dos sistemas físicos de águas e esgotos, com ênfase para as ETAR e ETA e as próprias soluções de princípio dos projectos de engenharia adoptados.
Aponto, em contraste, a desorçamentação e destruição continuada dos Laboratórios de Estado, em particular o LNEC, que tinha as atribuições de regulamentação, nomeadamente de segurança, de construções e obras públicas.
Aponto, em contraste, o descuro das origens de água, para o incumprimento dos planos de recuperação e mesmo da monitorização completa, da competência de serviços da administração central extintos e esvaziados.
Termino aqui, esperando ter contribuído, se não para a instrução do processo de decisão de V. Ex.cias, pelo menos para facilitar aos vossos eleitores a compreensão dos motivos das diferentes decisões que cada um dos Senhores Deputados entender tomar.
26. Tribunal de Contas, "Regulação de PPP no Sector das Águas (sistemas em baixa). Auditoria de seguimento" (2015), www.tcontas.pt/...
e Relatório nº 2/2015 - 2ª Secção
Esta Auditoria de Seguimento regista o incumprimento pelo ERSAR das seguintes recomendações:
1.A ERSAR deverá promover todos os esforços no sentido de que, quer em sede de revisão, quer de negociação contratual, as partes envolvidas acordem a redução das TIR acionistas, especialmente, quando estas sejam superiores a 10%.
2.A ERSAR deverá promover a implementação de mecanismos de partilha de benefícios, com os utentes e/ou os concedentes, em especial, os resultantes da descida programada, para os próximos anos, em sede de IRC.
3.A ERSAR deverá promover a eliminação progressiva de cláusulas contratuais que implicam a transferência de riscos operacionais, financeiros e de procura para o concedente.
4.A ERSAR deverá promover a adoção de pressupostos económicos, financeiros e técnicos prudentes, no âmbito do lançamento de novas concessões, no sentido de garantir a sustentabilidade económico-financeira das concessões, evitando, igualmente, potenciais reequilíbrios com repercussões negativas ao nível do tarifário a aplicar aos utentes.
27. Sobre o PEAASAR II fiz uma análise detalhada e crítica dos dados apresentados no artigo: O PEAASAR II «Plano estratégico para o sector das águas» - Revista Poder Local, Nº 146 – Dezembro de 2006, p. 9-27, revistapoderlocal.pt/...
O PENSAAR 2020 - Plano Estratégico de Abastecimento de Água e Saneamento de Águas Residuais 2020- é um documento da mesma índole, política e estratégica, que pode ser muito conveniente à exposição política da AEPSA, mas de forma alguma é uma fonte de dados fidedigna.
A apresentação oficial e links para os documentos estão aqui: www.apambiente.pt/index.php?ref=16&subref=7&sub2ref=9&sub3ref=1098
28. O RASARP 2016 (relativo a 2015) pode ser encontrado em: www.ersar.pt/...
A única parte usada no "estudo" de Cunha Marques são uns poucos gráficos de volume 1 e alguns extractos (escolhidos) da folha de cálculo "relatório de dados indicadores", que são também apresentados graficamente nos anexos i a iv ao RASAP. As folhas de cálculo de 2011 a 2015 encontram-se em www.ersar.pt/pt/setor/factos-e-numeros/dados-de-base ;
As instruções de preenchimento e cálculo dos indicadores estão no "Guia Técnico 19 - Guia de avaliação da qualidade dos serviços de águas e resíduos prestados aos utilizadores - 2.ª geração do sistema de avaliação 2.ª edição revista e atualizada"www.ersar.pt/pt/publicacoes/publicacoes-tecnicas/guias ; www.ersar.pt/_layouts/mpp/file-download.aspx?fileId=675098
29. John P. Mulreany; Sule Calikoglu; Sonia Ruiz; Jason W. Sapsin - Water privatization and public health in Latin America/ La privatización del abastecimiento de agua y la salud pública en América Latina, www.scielosp.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1020-49892006000100004
Extracto do sumário: "CONCLUSIONES: Nuestros resultados indican que no hay argumentos convincentes de tipo sanitario que respalden la privatización del abastecimiento de agua. Desde el punto de vista de la equidad y la justicia, dicha privatización podría fomentar una visión minimalista de la responsabilidad social en materia sanitaria que a su vez podría menoscabar las funciones del sector de la salud en el largo plazo."
30. Lobina, Emanuele – "Our Public Water Future The global experience with remunicipalisation" ; APRIL 2015; Published by Transnational Institute (TNI), Public Services International Research Unit (PSIRU), Multinationals Observatory, Municipal Services Project (MSP) and the European Federation of Public Service Unions (EPSU), www.psiru.org/sites/default/files/2015-04-W-OurPublicWaterFutureFINAL.pdf
31. Emanuele Lobina, Satoko Kishimoto, Olivier Petitjean, "Veio para ficar – a tendência global de remunicipalização", 2015, Publicado pela Unidade Internacional de Pesquisa de Serviços Públicos (PSIRU), Instituto Transnacional (TNI) e Observatório Multinacional. Edição portuguesa Colaboração com: Água de todos e STAL
www.aia-regiaosetubal.pt/sites/default/files/HereToStay-PT.pdf ;
Um resumo por Jorge Fael, 2015, "A remunicipalização dos serviços de água" na Revista Poder Local, www.revistapoderlocal.pt/
32. http://www.aguadetodos.com
33. www.stal.pt/... e www.stal.pt/
34. www.aia-regiaosetubal.pt/ , www.aia-regiaosetubal.pt...
35. Texto do Projecto de Lei e exposição de motivos; web.archive.org/...
Projeto de Lei Nº 368/XII, "Protecção dos direitos individuais e comuns à água" - Audição na Comissão Parlamentar do Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local – 4/7/2013 – Intervenção inicial de Francisco Brás, da comissão permanente da Campanha Água de Todos, em representação dos Proponentes da Lei, web.archive.org/web/
Re-apresentação na AR em 2016 pelo PCP e pelo BE: app.parlamento.pt/... e app.parlamento.pt
36. Ver: Comunicado da Associação Água Pública de 27 de Maio de 2011, sobre o programa conjunto do PSD, PS e CDS para privatização da água, web.archive.org/web/...
37. Tramitação na Assembleia da República e votações:
www.parlamento.pt/...
www.parlamento.pt/...
www.parlamento.pt/...
notícias:
www.aguadetodos.com
www.aguadetodos.com/iniciativa-legislativa-de-cidadaos/ ; /www.aguadetodos.com/...
38. Outros inquéritos e inventários, nacionais, regionais ou locais, fornecem outras informações muito úteis de mais detalhe sobre as redes públicas e são relevantes para interpretações e interpolações dos dados dos censos, que só se realizam de 10 em 10 anos.
Esses estudos, quando muito, se sérios e bem feitos, proporcionam a "proporção de população residente em zona servida por rede pública" – e muitas dessas pessoas poderão não estar ligadas à rede; outras pessoas residem em zonas sem rede pública, mas estão perfeitamente servidas por soluções individuais ou pequenas redes colectivas particulares.
Na caracterização geral dos níveis de atendimento por abastecimento de água e saneamento, esses estudos sérios complementam os dados dos censos sobretudo na diferenciação entre o serviço por rede pública e as soluções particulares – diferenciação que não é rigorosa nos censos, por imprecisão dos inquiridores e dos inquiridos.
Para além dos estudos sérios, são muito frequentemente divulgados valores completamente falsos de níveis de atendimento em abastecimento de água, drenagem de águas residuais e tratamentos de águas, por inépcia ou por vigarice oportunista.
39. com a excepção da EPAL – Empresa Pública de Águas de Lisboa - empresa pública de direito público mas com intervenção da Administração Central
40. Lencastre, A. (2003). «Hidráulica Urbana e Industrial», in Memórias Técnicas, Vol. II. Lisboa: LNEC, p. 568; citado por João Howell Pato, "História das políticas públicas de abastecimento e saneamento de águas em Portugal", Lisboa, Outubro de 2011, pg 100
repositorio.ul.pt/bitstream/10451/20099/1/ICS_JPato_Historias_LAN.pdf
41. INAG, DSP/DPP, 2006, "Resumo da evolução da drenagem e tratamento das águas residuais domésticas em Portugal, de 1985 a 2001 - dados compilados para efeitos da avaliação das emissões de metano provenientes das águas residuais domésticas nos anos de 1990, 1994 e 1998"
42. O livro "Poluição e Qualidade da Água" – Tema tratado no âmbito do Plano Nacional da Água , INAG (Instituto da Água) Direcção de Serviços de Planeamento, Lisboa, 2002, ISBN 972-9412-61-8 apresenta uma extensa caracterização, quadros, cartografia análise e diagnóstico da drenagem e tratamento das águas residuais domésticas no Continente, apresentando os níveis de atendimento, bem como das cargas poluentes geradas, cargas removidas pelos tratamentos e cargas poluentes afluentes ao meio hídrico. É a única publicação completa que foi feita sobre este tema, e refere-se à situação no período 1998-2001.
43. INAG, DSP/DPP, 2006, "Resumo da evolução da drenagem e tratamento das águas residuais domésticas em Portugal, de 1985 a 2001 - dados compilados para efeitos da avaliação das emissões de metano provenientes das águas residuais domésticas nos anos de 1990, 1994 e 1998"
Os números a negrito são obtidos dos Censos ou dos inventários do INAG; os números a azul, itálico, são interpolações de forma a manter a coerência.
44. Algumas notícias; Paços de Ferreira www.ambientemagazine.com/... ; Barcelos www.netconsumo.com/2009/03/acop-reitera-que-nao-ha-obrigatoriedade.html e barcelos-popular.pt/?zona=ntc&tema=8&id=537
45. Após o levantamento detalhado das redes públicas de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais efectuado no período 1998-1999, no âmbito dos Planos de Bacia Hidrográfica, o INAG manteve ainda recolhas de dados sobre esses temas até cerca de 2008 no âmbito do projecto "INSAR", mas a forma de recolha e organização dos dados, por falta de interligações e de suporte geográfico, não permitia calcular os níveis de atendimento; o INAG foi extinto em 2012.
46. Porto water innovation week 2017 portowaterinnovationweek.eu/
Mayors and Water Conference 2017: URBAN WATER AGENDA (2030) 29 de setembro, web.archive.org/...
www.portowaterinnovationweek.eu/mayors-water/datebook
47. Mayors and Water – Speakers : portowaterinnovationweek.eu/mayors-water/speakers
48. Ver "Sponsores & partners" em portowaterinnovationweek.eu/eip/sponsors#sponsors_partners
49. A Veolia, alias CGE, ex-Vivendi, de origem francesa, é a maior, mais antiga e mais politicamente intrusiva multinacional da água; Juntamente com a Suez, alias Lyonnaise des Eaux, também de origem francesa, tem a liderança do cartel das transnacionais dos negócios da água, acumulando os seus mandatários vários cargos nos órgão internacionais de definição e imposição de política capitalista da água, incluindo através do "Conselho Mundial da Água" e lobbying com enorme influência na CE.
Procurando no "google" "Veolia" e "privatization" aparecem 45 800 resultados ... 27300 resultados para a pesquisa em português – em espanhol e francês é mais utilizado o "alias" CGE, o mais antigo e que ainda permanece.
O livro "L'empire de l'eau – Suez, Bouygues et Vivendi – Argent, politique et gout du secret" , Yves Stefanovitch, Editions Ramsay, Paris, 2005, 535 pgs, conta a promiscuidade do poder político francês com esses negociantes da água desde Napoleão III (meados do século 19) até ao início deste milénio.
50. Media Partners, portowaterinnovationweek.eu/eip/media#media-partners-all[*] Engenheira .
Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .
*****
Especialistas já alertavam para escassez de água no DF há 20 anos
Em meio à crise hídrica, nem os temporais dos últimos dias foram suficientes para aumentar o volume dos reservatórios
Pedro Grigori*
http://www.correiobraziliense.com.br/
em 30/03/2017
http://www.correiobraziliense.com.br/
em 30/03/2017
A pouco mais de um mês do começo do período de seca, nem mesmo os temporais dos últimos dias se tornaram suficientes para que março terminasse, ao menos, na média histórica de chuvas. Os 257mm de precipitações registrados em fevereiro até ajudaram a levantar o volume dos reservatórios na época. Mas, neste mês, choveu apenas 72% do esperado — ou 130,4mm. Com isso, as barragens do Descoberto e de Santa Maria/Torto seguem com os níveis em 48,07% e 49,67%, respectivamente.
A água, principal responsável pela vida na Terra, é usada, diariamente, para consumo, produção de alimentos, higiene e ainda para acionar as turbinas em centrais hidrelétricas, gerando energia. E o assunto nunca esteve tão na boca do povo quanto agora, quando, uma vez a cada seis dias, o recurso é cortado da torneira dos brasilienses. Porém, a crise hídrica, que se agravou a partir de outubro do ano passado, com a instauração da tarifa de contingência para os grandes consumidores, não é tão inédita quanto parece. O Correio ouviu especialistas, pesquisadores e membros de sociedade civil que relatam estudar e vivenciar o problema há mais de 20 anos. O assunto também será debatido hoje durante o terceiro Seminário Águas Acima.
O escritor e ecossociólogo Eugênio Giovenardi, com vasto estudo sobre o meio ambiente, relatou que o governo e a população ainda não aprenderam a utilizar a água da chuva. “Na última terça-feira, choveu quase 30mm, o que corresponde a 30 litros de água por metro quadrado. E, na grande maioria dos casos, essa água desce ralo abaixo. Pela grande quantidade de água em terras brasileiras, criou-se uma consciência errada de que o líquido é um bem infinito. Sendo assim, acabamos nos deixando ficar confortáveis a não precisar aparar a água da chuva ou a reutilizar líquidos usados em casa, como na máquina de lavar ou em outras atividades”, conta.
O escritor lançou em 2005 o livro O Retorno das Águas, que previa um racionamento no Distrito Federal num prazo de 10 anos. “O que houve foi falta de critério no uso do dinheiro público. Quando inaugurado, o Descoberto deveria armazenar 102 trilhões de litros d’água. Isso, para uma população de 600 mil pessoas, era muita coisa. Mas, hoje, só Ceilândia tem 500 mil moradores. Novos projetos deveriam ter sido feitos”, afirma. Um dos planos, segundo o ecossociólogo, deveria ter sido o aproveitamento da água da chuva, ponto em que o presidente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Distrito Federal (Cau/DF), Alberto de Faria, também concorda. “O que propomos é regular o uso de diferentes tipo de água, dependendo da situação. Não indicamos que alguém beba a água da chuva, mas também é injusto lavar carros e calçadas com água tratada pela Caesb — um líquido com grande qualidade, que deveria ser adotado apenas para consumo”, destaca Giovenardi.
Problemas à vista
Mesmo com o aumento do nível dos reservatórios nas últimas semanas e o começo de novas obras de captação, a previsão da promotora de Justiça de Defesa do Meio Ambiente e Patrimônio Cultural, Marta Eliana de Oliveira, para os próximos meses, ainda é problemática. “Pesquisas mostram que chegaremos a dezembro com 11% dos reservatórios. E isso com a ajuda do sistema de captação do Lago Paranoá sendo entregue em setembro. Esse número já traz um alerta e, para piorar, em todos esses anos que trabalho no setor, nunca vi uma obra não atrasar. Ou seja, estamos contando com essa água que, talvez, nem chegue a tempo”, relata.Essa piora na situação hídrica e diversas vertentes que a rodeiam é tema de debate hoje na sede do Instituto Histórico e Geográfico do Distrito Federal. A terceira edição do Seminário Águas Acima tem entrada aberta e gratuita para toda a população. “Debateremos diversos assuntos, inclusive a aritmética da água, em que tentamos buscar uma solução para essa conta que não fecha, na medida em que temos mais pessoas do que água disponível”, adianta Eugênio Giovenardi, um dos palestrantes do seminário.
Programe-se
3º Seminário Águas AcimaOnde: Instituto Histórico e Geográfico do Distrito Federal (IHG/DF)— SEPS, Entrequadra 703/903, Conjunto C
Horário: das 8h30 às 12h e das 14h às 18h Não é necessária inscrição Entrada gratuita
O que dizem os especialistas
Escritor, ecossociólogo e acadêmico do Instituto Histórico e Geográfico do Distrito Federal (IHG/DF)
“Apesar de o Brasil ser detentor de 12% da água doce do planeta, a gestão do fornecimento de água à população não se tornou motivo de planejamento nem prioridade para os governos. Isso gerou uma crise histórica de gestão da abundância de água. Aquela cultura que vinha até ontem, de que a água é infinita, porque a técnica e a tecnologia vão dar um jeito no futuro, tem que ser deixada para trás. O racionamento de água é político, ele chega para contornar uma situação já causada, quebrando a brutal cultura de gasto, e, infelizmente, foi algo que demorou acontecer.”
Alberto de Faria,
Presidente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Distrito Federal (Cau/DF)
“A questão da água está ligada diretamente à quantidade de recursos para ocupar um lugar. Todas as ocupações humanas nasceram próximas à água, desde colonizações babilônicas e egípcias, ao lado do Nilo, por exemplo. O DF foi construído em cima da ótica de planejamento, mas faltou controle e gestão do espaço humano. Temos áreas, como Vicente Pires e Arniqueiras, construídas em cima de nascentes, que foram ocupadas por conivência de agentes públicos e ausência de fiscalização. O conceito de que essa invasão não terá consequências, de que a água é infinitiva, é que gera a nossa atual situação.”
Presidente da Associação de Produtores Rurais Pró-Descoberto
“Oficialmente, a crise hídrica virou pauta no ano passado. Mas é um assunto recorrente entre os produtores há mais de 20 anos, quando começamos a perceber e lutar contra a ocupação irregular de áreas de nascentes e reservas. A gente denunciava, porém, nada acontecia. Existe muita omissão com os problemas que estão acontecendo, mas, agora, com a crise, estamos tendo pequenos avanços, porque está se começando a falar do assunto. Esse não é um problema que vai se resolver em um ano ou dois, precisamos de ações continuadas de conscientização, como compromisso com as novas gerações.”
Marta Eliana de Oliveira,
promotora de Justiça de Defesa do Meio Ambiente e Patrimônio Cultura
“Não estamos lidando com algo que aconteceu do dia para noite. A bomba veio sendo montada ao longo dos anos e, agora, estourou no colo desse governo. Mas a atual crise foi causada por vários fatores, de vários segmentos, inclusive da sociedade civil. Nós temos que nos unir e cobrar mais, fazer com que sejamos ouvidos, pois não dá para dizer que nunca houve planejamento. Houve, sim. Tivemos Corumbá IV, água para 100 anos, como diziam. Na minha opinião, foi um plano equivocado e não executado. Mas, agora, não é a hora de falar ‘eu avisei’. Temos que nos conscientizar, porque hoje é um problema de todos.”
* Estagiário sob supervisão de Sibele Negromonte
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Falta de água | Nerdologia 59
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A crise hídrica chega ao Planalto Central
Brasília entra em contagem regressiva para iniciar racionamento de água
Cinco cidades satélites já sofrem com rodízios semanais
AFONSO BENITES / Brasília
24/set/2016
Se não chover intensamente nos próximos dois meses, o Distrito Federal passará a racionar o fornecimento de água para seus quase 2,9 milhões de habitantes. Além disso deverá criar uma nova taxa que incidirá na conta a ser paga mensalmente. Hoje, ao menos 300.000 pessoas de cinco regiões administrativas já sofrem com uma espécie de rodízio no abastecimento. Em alguns bairros, os imóveis ficam 23 horas seguidas sem água até duas vezes por semana.
Ao menos três razões impactaram na atual crise hídrica da capital do país: a falta de chuva (neste ano foram 86 dias sem cair uma gota d’água na região); uma série de ocupações irregulares de terras, (hoje são mais de 500 condomínios e invasões ilegais em áreas públicas) e a ausência de obras visando aumentar a captação de água. Três estão em andamento, mas a primeira delas só deve ficar pronta em 2017.
“Vivemos um ano atípico. Em fevereiro deveria chover 220mm, mas choveu 54mm. Em abril, deveria ser 120, mas só veio 15. Sem chuva e com as ocupações desordenadas, a crise só cresceu”, afirmou o doutor em geologia e coordenador do curso de Engenharia Ambiental da Universidade Católica de Brasília, Marcelo Gonçalves Resende.
Os dois principais reservatórios que abastecem 85% da população, o do Descoberto e o de Santa Maria, atingiram nesta semana seus menores índices de armazenamento de água desde que a Agência Reguladora de Águas, Esgoto, Energia e Saneamento do DF (Adasa) passou a fazer a medição, em 1989. O primeiro, atingiu apenas 36,6% de sua capacidade, o segundo, 48,5%. Neste mesmo período do ano passado, eles estavam com 65% e 89%, respectivamente.
Há pouco mais de um ano, o governador do DF, Rodrigo Rollemberg (PSB), comemorava que o reservatório de Santa Maria estava transbordando. A reportagem esteve no mesmo local nesta sexta-feira e o cenário é bem diferente das imagens que o chefe do Executivo local chegou a postar em suas redes sociais da barragem vertendo. Agora, as margens do Santa Maria estavam secas e bem distantes de atingir o paredão por onde a água escorria. A forte chuva que caiu nesta sexta não foi capaz de amenizar essa queda do nível das barragens. Para isso, seria necessário chover por quase duas semanas consecutivas ou em diversos dias ao longo dos próximos dois meses.
Um técnico que trabalha há quase duas décadas na Companhia de Saneamento Ambiental do Distrito Federal (Caesb) relatou que esse é o pior momento que ele já testemunhou. Por essa razão, a Adasa decretou estado de alerta, que consiste na ampliação das campanhas de conscientização da população, da preparação de planos para iniciar o racionamento, assim como a realização de estudos para criar novo imposto sobre a água.
O corte de água temporário que hoje abarca moradores de Planaltina, São Sebastião, Sobradinho, Brazlândia e Jardim Botânico, ocorrerá em todas as 29 regiões administrativas caso um dos reservatórios atinja os 20% de sua capacidade. Nessas cinco localidades o argumento é que o rodízio de fornecimento só ocorre porque elas não estão interligadas com a rede do Descoberto/Santa Maria e dependem da captação de pequenos córregos que estão com a vazão reduzida. Além disso, são áreas em que agricultores retiram a água diretamente dos rios e córregos, o que diminui a quantidade que poderia ser entregue à população. “Os irrigantes precisam dessa água assim como os moradores das áreas urbanas. Em alguns momentos chegou a se ter um conflito pela água, mas negociações são constantemente realizadas para evitar que falte água para um ou para outro”, afirmou o diretor financeiro e comercial da Caesb, Marcelo Teixeira.
Consumo excessivo e tempo seco
No Distrito Federal, o consumo médio por habitante supera os 180 litros diários de água, segundo a Caesb. Em dias mais quentes e secos, como o recorde do ano registrado na quarta-feira passada (34º C e 15% de umidade), ultrapassa os 200 litros diários. Para a Organização Mundial da Saúde, o consumo entre 100 e 110 litros diários bastaria para cada morador.
“Desde que Brasília foi criada, tivemos abundância de água. Nossa região já foi considerada uma das caixas d’água da região. Até por isso, criou-se um problema. Ninguém escuta uma campanha de conscientização enquanto houver água na torneira. Parece que temos de chegar no nível crítico para a população começar a prestar atenção e economizar”, ponderou o diretor-presidente da Adasa, Paulo Salles. Ele é um dos que coordena os trabalhos para implantar uma taxa extra na água, mas diz que o momento ainda não é para pânico. "Temos de conscientizar as pessoas".
Os primeiros alertas de que a crise estava se aproximando foram dados há quase cinco anos, quando se notou que os índices pluviométricos na região central do país estavam diminuindo. O governo chegou a se mexer para evitar qualquer tipo de medida drástica, mas a principal obra imaginada para evitar o racionamento, o reservatório de Corumbá 4, que seria responsável por abastecer 850.000 pessoas (metade no Estado de Goiás e metade no DF) atrasou mais de dois anos. Deveria ficar pronta este ano, mas a previsão é que o prazo se estenda para 2018.
Quem acompanha de perto a obra acha que ela não será entregue tão cedo. A razão é que o presidente da Companhia de Saneamento de Goiás (Saneago), José Taveira, foi preso pela Polícia Federal, no mês passado, em um esquema de suposto de desvio de dinheiro para quitar dívidas políticas do PSDB goiano. A Saneago é a principal parceira da Caesb no empreendimento. Desde a prisão de Taveira, a parte da obra que cabe a Saneago está parada. Ela seria a responsável por captar a água do rio Corumbá. Já a parte da Caesb, que seria de fazer o tratamento dessa água, segue, mas em ritmo mais lento.
As outras duas obras para abastecer a população brasiliense ainda estão longe de acabar. A do sistema Bananal, responsável por abastecer 170.000 pessoas, ficará pronta em outubro de 2017. Uma outra, que pretende captar a água do lago Paranoá (um reservatório artificial que cobre quase todo o Plano Piloto) acaba de ser licitado e a previsão é que a obra seja concluída em 2019. A expectativa é que 600.000 moradores sejam abastecidos por esse novo sistema.
Ocupações ilegais
Apesar de ser uma cidade planejada, Brasília é uma das regiões onde há o maior nível de invasões de áreas públicas do país. O que chama a atenção é que a maior parte delas é feita por moradores de classes média e alta. São condomínios residenciais distantes da área central da cidade e que acabam ocupando mananciais, aterrando nascentes ou simplesmente cimentando áreas que seriam usadas para absorver a chuva. Boa parte dessas invasões chegaram a ser estimuladas pelo próprio Governo nos anos 1980 e 1990.
“Temos uma dificuldade grande de retirar esses moradores. A pressão imobiliária não leva em conta nem se a área é de preservação ambiental ou não”, alertou a promotora de Justiça Marta Eliana de Oliveira, da Área de Meio Ambiente. Segundo a promotora, uma combativa ambientalista que atua na área desde 2005, há mais de 500 invasões ilegais que acabam enfrentando algum processo judicial.
Além das novas obras, Oliveira defende a aplicação de uma “tarifa de contingenciamento”. “Na área ambiental temos os princípios do poluidor-pagador e do usuário-pagador. Se as pessoas estão consumindo mais do que deviam, acho que deveriam pagar por isso”, afirmou a promotora.
Enquanto especialistas e representantes do Governo assumem que a ocupação irregular é um dos principais motivos para a crise hídrica, a própria administração pública dá mau exemplo. No mês passado, iniciou a construção do Trevo de Triagem Norte, um conjunto de 17 viadutos que tem a intenção de desafogar o trânsito de carros em um dos principais acessos de Brasília para algumas das cidades-satélites. O problema é que o início da obra já resultou na derrubada de mais de uma centena de árvores e no aterramento da nascente de um pequeno córrego. O discurso, às vezes destoa das ações.
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